No entanto este ano, no Brasil, foi bem diferente, com a festa da democracia mobilizando milhões de espectadores e internautas durante a posse de Dilma Rousseff na Presidência e a despedida daquele que é, certamente e por méritos objetivos, o melhor presidente que o país já teve, Luiz Inácio Lula da Silva, que entra definitivamente para a história da crônica política mundial ao deixar o governo, após 8 anos, com 87% de aprovação popular.
A primeira mulher no poder
É preciso ser muito obtuso para não reconhecer a importância e a simbologia de termos, pela primeira vez, uma mulher na Presidência. Em um país de machismo arraigado, com altos índices de violência contra a mulher e onde a diferença entre os dois sexos, no que concerne a salário e a oportunidade de ascensão a cargos de chefia, é pornográfica, superando os 50%, a eleição de Dilma significa uma conquista e um reconhecimento, além de um desafio e uma grande responsabilidade.
Que essa mulher eleita tenha sido, ainda jovem, barbaramente torturada durante 22 dias, permanecendo presa por três anos, vem acrescentar mais importância à simbologia que cerca tal eleição. Marca a redenção histórica de uma geração que arriscou suas vidas pelo país, em plena juventude, e representada por uma figura pública que – ao contrário do que ocorreu com Fernando Gabeira e Cesinha – não abriu mão de seus ideiais ou comercializou-os na bacia das almas da política nacional. A erradicação da miséria e uma sociedade mais justa, motes que moveram a militante Dilma em fins dos anos 60 continuam a mobilizar a presidente eleita, sendo, como o discurso de posse evidenciou, itens prioritários em sua agenda.
Outro estilo
Além da ênfase na importância de elegermos uma mulher, três aspectos saltaram à vista nos dois discursos que Dilma proferiu em sua posse: o primeiro é que seu estilo é mais objetivo e técnico – e menos emocional – do que o de Lula, não obstante o o âmago das questões girar, como já mencionado, em torno de um tema comum, a justiça social e a erradicação da miséria.
O segundo é a ênfase dada por Dilma à questão da educação: não apenas frisou a importância da área para o avanço do país em sua administração, mas nomeou especificamente dois itens da agenda: a expansão do Pro-Uni para o ensino médio (com bolsas para que estudantes carentes possam freqüentar escolas privadas) e a elevação do salário e aprimoramento das condições de preparação e exercício da profissão para professores da rede técnica e universitária federal. Trata-se de medidas essenciais, urgentes, às quais eu acrescentaria a necessidade de modernização e de expansão drástica do acervo das bibliotecas e a desburocratização dos processos para importação de equipamentos e livros por universidades públicas.
Se o Brasil quer mesmo ser uma das principais potências mundiais nas próximas duas décadas, não basta erradicar a miséria e diminuir assimetrias sócio-econômicas – isso é imprescindível, mas é também preciso patrocinar e tornar efetivo um salto de qualidade na educação (em todos os níveis), na pesquisa e no avanço tecnológico.
Um terceiro aspecto a diferenciar Dilma do estilo do presidente anterior é a substituição das metáforas futebolísticas – que deliciavam aficionados do esporte e irritavam imprensa e os soi disant cultos – por menções poéticas à literatura (a presidente eleita valeu-se, nos discursos, de duas das mais famosas frases de João Guimarães Rosa). No Twitter alguém observou que se tratava de uma escolha mais feminina. Pode até ser – embora muitos homens gostem de poesia -, mas o aspecto mais importante a ressaltar é o potencial didático de tais citações presidenciais, no sentido de despertar curiosidade e incentivar tais leituras.
Promissor 2011
As diferenças de estilo acima citadas fizeram com que, já na posse, aflorasse com contornos mais definidos a persona da Dilma presidenta, com direito a emoção e lágrimas (a desfazerem a imagem de fria e inflexível que a velha mídia lhe quer pespegar) e demonstrando uma grande personalidade - o que só surpreende aos incautos ou aos preconceituosos.
A determinação e o rigor que transparecem de suas palavras e de seu estilo sugerem que teremos, nos próximo quatro anos, uma comandante determinada no comando do leme do país.
Início de ano mais auspicioso, impossível.
(Imagem de José Cruz, da Agência Brasil, retirada daqui e reformatada.)
Um comentário:
Hoje deu vontade de estar em Brasília pra ver a História acontecendo in loco. E, embora seja até bem contida, dei RT em tuítes sobre a posse da Dilma como se não houvesse amanhã - a ponto de um seguidor descontente reclamar e eu falar pra ele me dar unfollow (o que é tão libertador quanto você mesmo dar unfollow). :D
Mas eu sei que não ficaria tão contente se a primeira presidenta da história fosse, por exemplo, uma Kátia Abreu... Acho que neste caso eu ia ficar é bem caladinha (melhor que ficar ostentando má vontade no dia da posse).
Só posso desejar um bom governo a Dilma, pois quem ganha com isso somos todos nós.
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