Como noticiado ontem
por The Intercept, "A Odebrecht teria pagado propina para que
parlamentares e integrantes do Executivo favorecessem os interesses
do grupo em ao menos 12 medidas provisórias, editadas entre 2005 e
2015 pelos ex-presidentes Lula e, especialmente, Dilma Rousseff,
segundo depoimentos de executivos e ex-executivos da companhia."
Os atos descritos na
delação evidenciam, uma vez mais, que o PT, no poder, não apenas
deixou de combater a corrupção - abandonando uma de suas bandeiras
históricas -, mas nela se chafurdou, traficando o Estado brasileiro.
Isso posto, é forçoso
registrar que as mesmas delações as quais, comprovadas,
incriminariam o PT, incluem expoentes de todos os partidos a habitar
o condomínio do poder nos últimos 23 anos - inclusive o
ex-presidente tucano FHC e o atual, Michel Temer (PMDB-SP), além de
cerca de um terço do Senado. Tal fato leva a constatação -
evidente aos não-militantes e aos que têm algum conhecimento da
história política do país - de que a corrupção não começou com
o PT e nem a este se restringiu.
Se o reconhecimento de
tais obviedades, convém reforçar, não serve de álibi à conduta
do partido dito de esquerda, tampouco justifica o tom dominante na
cobertura televisiva do escândalo. Esta continua majoritariamente
focada nas figuras de Lula e Dilma - sem justificação jornalística
para a menor atenção ao também delatado Temer e a figuras do
primeiro escalão do Executivo e do Legislativo atuais. Além disso,
tem adotado o inédito cuidado de explicar, de forma reiterada, que
ninguém é ainda culpado e de ouvir com parcimônia os acusados,
exatamente como deve uma mídia responsável agir na democracia - só
que não foi assim quando os acusados se limitavam ao PT.
A corrupção como regime político-eleitoral
À medida que a
Lava-Jato avança, contrariando tanto a fabulação auto-vitimizante
do petismo quanto o moralismo filisteu da atual coligação
governista, vai ficando evidente que o que ela desvela é o modus
operandi da política brasileira, historicamente entranhado e
indistintamente praticado, sob o patrocínio das grandes corporações,
pelas agremiações partidárias que assomam ao poder.
Somada às diversas
delações acerca de doações eleitorais, a admissão de que a
corrupção ativa da Odebrecht teria resultado em 12 medidas
provisórias de interesse da empresa torna lícito questionar se e
até que ponto é o eleitor que determina, com seu voto, o futuro do
país, ou se a democracia representativa brasileira, na prática, é
uma ficção destinada a encobrir, com um véu de republicanismo, o
conluio entre interesses do capital e a ambição de máfias de
políticos. Pois, como observa Pablo Ortellado, professor de Gestão
de Políticas Públicas na USP,
"Não estamos falando mais do velho modelo da fraude de licitação na qual o sobrepreço é dividido entre a empresa e o agente público corrompido. Estamos falando de bilhões de reais na forma de propina e na forma de financiamento de campanha sendo diretamente trocados por obras e benefícios legislativos e tributários. Não estamos falando da corrupção individualizada ou mesmo setorializada, mas da subordinação de todo o sistema político ao interesse de uma empresa. Ficamos pensando o que uma investigação no setor de carne e alimentos, no setor financeiro e no setor de telecomunicações descobriria."
Tal questão, trazida
para as urgências do presente, torna imprescindível interrogar se
as ditas "reformas"defendidas por Temer - com amplo apoio
midiático - como a única saída para a crise do país, à custa de
trabalhadores e aposentados, seriam mesmo uma tentativa
bem-intencionada de tomar providências em benefício do país, ou se
não passam de medidas patrocinadas pelo grande capital em seu
próprio benefício, em troca do enriquecimento de uma corja de
criminosos travestidos de políticos.
Será mesmo preciso
aguardar uma nova etapa da Lava-Jato, lá por 2020, para obtermos as
respostas?
(Ilustração retirada
daqui)
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