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segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

FHC, Aécio e o jogo político de 2014

A insistência de Fernando Henrique Cardoso para que Aécio Neves se lance, desde já, como o candidato tucano à Presidência, nas eleições de 2014, suscitou inicialmente suspeitas as mais diversas. Em um partido com um histórico de ataques internos que incluem dossiês e notas plantadas nos jornais, marcado pela rivalidade entre caciques paulistas e mineiros e acostumado a definir seus candidatos em restaurantes da moda, com a cúpula reunida em torno de um vinho caro, o gesto de FHC tanto poderia significar um endosso efetivo quanto uma manobra dissimulatória.

Pouco a pouco, porém, começou a ficar claro que a dobradinha FHC-Aécio é para valer: ante a fadiga de material evidente do eterno derrotado José Serra e a imobilização forçada imposta pelo PT a Geraldo Alckimin – que, se decidir disputar a Presidência, franqueia também o estado de São Paulo à hegemonia petista -, FHC viu a chance de reapossar-se do poder no interior do partido, associando-se a um político que, embora dê mostras seguidas de imaturidade, é relativamente jovem, de um estado importante, herdeiro da mística de Tancredo Neves, e, mais importante, disposto a tirar FHC e seu legado do limbo em que foram mantidos pelos próprios candidatos peessedebistas nas últimas eleições presidenciais.

Reforça a impressão de que a candidatura Aécio pode ser mesmo para valer a articulação, nos últimos dias, de economistas historicamente ligados ao PSDB – ou seja, a serviço de grandes bancos e do capital especulativo internacional – para que elaborassem um discurso econômico estratégico para o candidato tucano.

Como seria de se esperar, não há nada de novo ou de surpreendente na plataforma elaborada por tais economistas, cujos nomes, de triste memória, pertencem ao tempo em que, segundo os jornais, não havia mais inflação e a economia ia bem, embora, detalhe desimportante ignorado pela imprensa, o país fosse muito mal: na vida real, a pobreza ostentava índices alarmantes. o desemprego era da ordem de 20%, e o Brasil, à beira da falência a cada ano e meio, recorria de pires à mão ao FMI, endividando-se cada vez mais e perdendo paulatinamente a soberania para tomar decisões na área econômica.

O tempo passou, a situação econômica do Brasil – e, mais importante, do povo brasileiro -, embora não deixe de apresentar desafios de monta, encontra-se em outro patamar, se comparada à do outono neoliberal de FHC, com o maior programa de combate à pobreza do mundo reestruturando o edifício social brasileiro, com a perspectiva real de extinção da miséria bem antes do prazo estipulado, com pleno emprego, promoção de acesso de amplos segmentos ao crédito e ao consumo, recuperação da capacidade de investimento do Estado, redução substancial dos juros reais e o atual redesenho das bases econômicas do país, de modo a privilegiar o investimento direto em detrimento da especulação financeira das últimas décadas.

Mas as ideias defendidas pelos economistas convocados pelo tucanato ignoram não só todas as conquistas acima elencadas, mas os graves danos à economia e à sociedade que o neoliberalismo vem causando, atualmente, em diversos países da Europa. A impressão que temos, ao lê-las, é que o receituário neoliberal é o dernier cri do planejamento econômico, uma panaceia recente e bem-sucedida burramente ignorada pelos toscos governos petistas. Naturalmente, não há menção a povo ou ao que exale atenção ao social na bula econômica tucana para as eleições do ano que vem.

Ainda assim – e por paradoxal que pareça -, é um avanço que o PSDB arrisque defender uma plataforma econômica marcada por tamanho atraso. Pois, não obstante inepta, anacrônica e elitista, representa um primeiro esboço concreto de proposta programática, uma novidade em se tratando de um partido que se caracterizou, nas três últimas eleições presidenciais, por lançar candidatos mas não lançar projetos, valendo-se unicamente do apoio que a mídia corporativa lhe dá, ocultando suas mazelas e supervalorizando as das forças políticas que se lhe opõem, e do uso de táticas políticas extremamente agressivas, preocupadas em difamar e em gerar insegurança e terror – como a manipulação da questão religiosa por José Serra, em 2010, exemplifica de forma cabal.

A realidade não permite ilusão quanto ao grau de manipulação midiática que veremos nas próxímas eleições, e a ausência de José Serra nas cédulas de votação não significa, necessariamente, que os métodos serristas estarão ausentes da disputa. Mas quanto mais projetos e ideias a oposição lançar, e mesmo se tais projetos e ideias estiverem em desacordo com os avanços sociais ou se mostrem atrasados e retrógrados, voltados às elites, mais democrático será o debate político, mais possibilidades terá o petismo de contrapor propostas e, assim, melhor será para o país.

Daí conclui-se que, por incrível que pareça, o retorno de FHC ao palco político nacional pode vir a ser benéfico até mesmo para o PT – e para além da ironia implícita em tal afirmação.


(Desenho retirado daqui)

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