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segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Como agem os covardes

Tom Jobim é um dos meus grandes ídolos. Encarna, na minha opinião, algumas das características mais agradáveis de uma imagem idealizada do brasileiro: é gentil, criativo, inteligente, sensível, espirituoso, boêmio; admira e exalta as mulheres, foi ecológico avant La lettre, é internacional sendo profundamente brasileiro, tem reverência pelos predecessores mas é inovador, faz lindas músicas e – talvez o que mais me agrade – é muito engraçado, um figuraça.

No entanto, numa entrevista para o Roda Viva a que eu assisti tantas vezes que estraguei a fita (nos tempos do VHS), mas cujos links para a versão digital integral me foram fornecidos por Raphael Neves, do politikaetc., com os dizeres: “aí vai um presente” – o qual eu, maravilhado em poder rever o programa, assim o considerei -, Tom insiste numa oposição entre “homens de bem” (entre os quais ele se inclui) e “os outros” que me incomoda.

Não gosto dessas distinções peremptórias entre seres humanos estabelecidas a priori, sejam positivas (“homem de bem”, “cidadão exemplar”), sejam negativas (“bandido”, “marginal”, “pivete de rua”). Desagradam-me sobretudo porque tais diferenciações facilitam o agravamento da confusão reinante entre pobreza e criminalidade. Transgrediu-se a lei? Que seja julgado e punido, podendo, aí sim, ser considerado um criminoso enquanto estiver cumprindo pena. Pagou sua dívida com a sociedade? Volta a ser cidadão. É assim que a lei funciona, goste-se ou não.

Decorre dessa posição - e do horror ao neoudenismo - minha opinião contrária a campanhas do tipo “Parlamentar ficha limpa”. Primeiro, porque o cidadão, queira ou não concorrer a cargo público, só pode ser considerado culpado após sentença transitada em julgado - e, mesmo neste caso, como exposto no parágrafo acima, recupera seus direitos após pagar a pena.

Segundo, porque seria facílimo para o grande capital criar uma usina de processos contra políticos de esquerda – e nossa Justiça, que condena Erundina e poupa os que “roubam mas fazem”, certamente acabaria por acatar alguns deles.

Se a Justiça não funciona a contento, que seja reformada, sem estuprar a Constituição.

Essa posição, digamos, legalista, não quer dizer, no entanto, que eu considere que a lei abarque todas as transgressões sociais – não o faz particularmente em relação a uma série de violações morais. Por exemplo: parece-me inegável que o rumo que a atuação política de personagens como Sonsinha ou Gabeira tomou nos últimos tempos, em contraposição às suas respectivas atuações pregressas pode levar seus seguidores de longa data a considerarem-se traídos. Mas a resposta à metamorfose de tais figuras não é da alçada da Justiça, e sim das urnas.

Já quando debilóides ressentidos da pseudoesquerda se aliam a pasquins decadentes ligados à pior direita para difamar cidadãos trata-se de covardia da pior espécie.

O mesmo se dá quando crackers anônimos, a soldo ou por escravidão voluntária aos interesses do grande capital, atacam o blog de quem está apenas exercendo seu direito de expor, de maneira polida e argumentativa, suas idéias – como ocorrido neste espaço nos últimos dois dias, sempre no mesmo post sobre o "caso Cesinha" na Folha e incluindo, no primeiro ataque, a colocação de banners saudando a ditadura militar brasileira.

Tais ataques corroboram e legitimam minhas críticas à direita e vêm confirmar que esses são seus métodos: antidemocráticos e visando interditar o debate através da truculência.

A história não se repete, senão como farsa, já dizia o velho Marx: ontem, bombas e espancamento de atores; hoje, intimidação a blogueiros e uso truculento e ilegal da tecnologia.

Por mim, tudo bem: tenho backup do blog inteiro e, se necessário, migro para um hospedeiro mais seguro. Como dizia, em plena ditadura, o grande letrista Paulo César Pinheiro – que compôs a bela Matita Perê com Tom Jobim -, “Você corta um verso, eu escrevo outro”.

A luta será renhida.

2 comentários:

Thaís Cavalcanti disse...

"Perfeição", quando diz respeito à natureza humana é algo assustador. Isso porque qualquer atributo vinculado a ela jamais soará verdadeiro.
Assim acontece com a imagem do tal "cidadão de bem". Esta noção apenas nos afasta do "homem real" e cria uma atmosfera propícia para equívocos, injustiça e preconceito. Trata-se, na verdade, de um subterfúgio pronto a servir ao interesse de ocasião: seja para naturalizar alguns vícios e justificar a impunidade e a conivência; seja para reiterar estereótipos de "sapos barbudos" X "caçador de marajás" ou criar novos maniqueísmos.
Expor tais contradições e vícios continua sendo a melhor forma de resistir.

Unknown disse...

Thata,

É a matéria da qual se alimenta o neoudenismo e toda essa manipulação pseudoética barata que ora vivenciamos.

Bem-vinda ao blog!