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quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Por que os homens não ligam?

("The Day After (1894-5), por Edward Munch, retirado daqui)

Histórias de Amor Amoral I - Homens

Você, cara leitora, saiu com o moço. Não foi nada planejado: fim de expediente, o grupo se dissipou, uns aproveitando uma carona, outros afoitos pra voltar pra casa, onde uma família os esperava. Ficaram vocês dois. Tava calor, horário de verão, um céu ainda arrebentando de azul: decidiram “tomar um choppinho”.

A noite foi muito gostosa: um papo fluente, pontuado de risadas, num ambiente agradável, em que os garçons não se faziam sentir; aquele céu que arrebentava em azul se desfez em tons roxos e violetas e houve até, por alguns momentos, um último raio de sol que refletia nas águas do mar, lá longe.

Foi justamente quando você chamou a atenção dele para esse fenômeno que a atmosfera mudou: os olhares tornaram-se mais detidos, os lábios mais próximos a cada vez que ambos voltavam a cabeça; ele começou a acariciar seu braço de forma suave mas decidida. Se beijaram longamente – beijos correntinha, que se emendam um no outro.

Quando voltaram à vida, era noite.

O sexo? Você, fogosa leitora, já teve melhores, muito melhores... mas foi intenso, com ânsia de desbravar, pleno de energia e virilidade. E longo, muito longo: se estendeu pela noite e adentrou a manhã como uma longa sinfonia, com momentos de quase silêncio e outros em que valkyrias cavalgavam ao som de technomusic e riffs de guitarra. Nada mau pra uma primeira noite, em algum momento você pensou.

No manhã seguinte, bem cedo, ele não deixou você pegar um táxi e fez questão de levá-la. Deram um longo beijo em frente ao seu prédio (fazendo você desejar que seu ex passasse por ali bem agora) e se despediram olhando nos olhos:

- Eu te ligo – ele disse sorrindo. Esperou você, sob o olhar de reprovação/ciúme do porteiro, tomar o elevador, deu um tchauzinho de longe enquanto a porta se fechava e só então arrancou.

Na hora do almoço o celular tocou, chamada de um número desconhecido. Você atendeu tentando disfarçar a euforia. Mas não era ele. Naquele dia ele não ligou.

Nem no seguinte.

Nem nunca mais.


Por que ele não ligou? Por que os homens não ligam?

A explicação corriqueira, brotada da confluência de feminismo e psicanálise vulgar, tem duas versões: a primeira, que tem um sabor anos 50 e uma concepção simplista do que seja o ser masculino, diz que o moço, tendo satisfeito seus baixos instintos, atingiu seu objetivo. Desinteressou-se, portanto. Eis porque, segundo esta versão, a prendada leitora deveria sempre “fazer-se de difícil”...

A segunda versão é menos bronca: o moço, justamente por ter adorado a noite, o sexo, exultado com a própria performance e obtido muito prazer, evita um novo encontro por temer não ser capaz de repeti-la (ou, pior, de fracassar), de ter de lidar com um diálogo sexual mais franco – o qual viria a destruir a visão mítica da tal noite priáprica; além, é claro, de temer, acima de tudo, a possibilidade de se apaixonar.

O fato de tal versão, ao caracterizar o homem como um covarde, constituir, indubitavelmente, um mecanismo de defesa da mulher – como os que Anna Freud analisa em Le Moi et les mécanismes de défense – não o invalida, mas torna ainda mais evidente o quanto ele é uma construção reativa, e não uma regra.

Porém, no caso em questão não se tratou de nada disso – e sim de uma versão que, por demais dolorosa, as mulheres, que detêm a primazia da fala no âmbito afetivo-sexual, hesitam em enunciar publicamente.

O que ocorreu foi que ele não achou o papo no bar agradável, mas chato; que na manhã seguinte ao sexo – que ele também já teve melhor, muito melhores -, enquanto a moça pensava que fora bom pra uma primeira noite, ele tinha ganas de expulsá-la da cama; e que ele só fez questão de levá-la na porta de casa porque de uma maneira estranha intuiu que, assim, ela não se sentiria autorizada a bater em sua porta por si mesma.

8 comentários:

bete disse...

hahhahhaha. como sou uma moça realista e bem pouco romântica, aposto na terceira e definitiva versão.
ou como diz um amigo meu, uma pena que ela não tenha virado pizza de manhã, porque assim ele comeria a pizza depois do sexo e jogaria a caixa fora. quer dizer, a maiorai das vezes, a absoluta maiorai das vezes o sexo depois do sexo só foi isso. sexo mesmo e não vai ter de novo. simples assim. aceite e e a fila anda.
só vc par escrever isso desse jeito tão elgante!

Unknown disse...

Hahahha, virar pizza é ótimo, daria um conto surrealista.

Quanto à sua falta de romantismo, reluto em acreditar - e não compartilho: sou romântico incurável.

Um beijo,
Maurício.

bete disse...

ok, retificando, não sou a romântica tradicional, com complexo de cinderela e que enxerga o mundo com lentes cor de rosa.

b disse...

Não entendo, nunca conhci uma mulher que estivesse a fim de sexo por sexo...

Se me faço de apaixonado pra atingir o objetivo, é errado... se sou sincero e digo que quero simplesmente sexo, sem qualquer envolvimento, sou tarado e acabo ofendendo...

Ou sou mto burro, ou azarado demais pra conhecer mulheres.. o louco....rsr

Puebla disse...

Será que ela não sonhou e esse cara não existe? Tanto tempo solitária a fez alucinar um don Juan fantástico extremamente habilidoso "asy como yo".
As drogas de hoje...

Unknown disse...

Puebla, Thiago e Iaiá,

Muito engraçado como cada pessoa reage de um jeito ao texto.

Tô achando hilário!

Abraço,
Maurício.

Rezix disse...

Hahahahah... bem mais simples do q se pensa, né?
Aliás, os homens são simples, as mulheres que querem complicar e imaginar que haja muuuitas intenções no que eles fazem...hehehehe...
E, como sempre, texto perfeito, Mau!
Beijos da Rê.

Unknown disse...

Sei, não, Rê,

Não entendo nada de homem...aha,Ra, ra,ra,ra!!....(nem de mulher...aha, Ra, ra,ra, ra!!!).

Legal ver vc aqui!

Bjos,
Maurício.