(Foto: Márcio Borges/AE)
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor do nosso jardim.
Não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores, matam o nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
(Eduardo Alves da Costa, "No caminho com Maiakóvski", 1964).
e roubam uma flor do nosso jardim.
Não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores, matam o nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
(Eduardo Alves da Costa, "No caminho com Maiakóvski", 1964).
A invasão de um campus universitário por forças militares é, por si só, condenável; mesmo em plena ditadura militar aconteceu com raridade extrema (UNB, PUC, quantas vezes mais?), como lembra Marjorie Rodrigues .
Porém, os governos do PSDB que governam São Paulo há mais de uma década, tal como ocorre no poema acima, primeiro passaram a permitir a entrada da polícia do campus da USP, algo antes inimaginável na história da instituição.
Agora, a polícia de José Serra é responsável não apenas por uma invasão, mas por espancamentos, tiros com bala de borracha, uso de bombas lacrimogêneas e de concusão (que, como o impressionante relato do professor da USP Pablo Ortellando explica, estilhaçam e causam ferimentos) contra estudantes cercados e indefesos - que, em seu próprio local de estudo protestavam pacificamente.
O que virá a seguir? Um cadáver?
Observem, no vídeo abaixo, que a polícia ataca e atira contra os estudantes sem ter sido atacada (no sempre ótimo blog de Altamiro Borges há um vídeo ainda mais impressionante).
Observem, no vídeo abaixo, que a polícia ataca e atira contra os estudantes sem ter sido atacada (no sempre ótimo blog de Altamiro Borges há um vídeo ainda mais impressionante).
Como assinala Túlio Viana, essas são consequências da irresponsabilidade de se mandar tropa de choque a um campus universitário. Ao que Idelber Avelar - que, só pra variar, fez a melhor "cobertura" das atrocidades na USP - acrescenta que a utilização contra estudantes de tamanha truculência é "responsabilidade direta da Polícia subordinada ao governador. Ele tem obrigação de responder por ela. São atrocidades perpetradas pelo poder público".
Portanto, com esse inaceitável uso da violência contra jovens universitários indefesos, fica cabalmente demonstrado que "O Sr. José Serra não tem autoridade moral para ser Presidente da República Federativa do Brasil. Haja mãos e pés para contar os exemplos de truculência, autoritarismo e vocação ditatorial. Esse senhor simplesmente não sabe conversar com a sociedade civil" – finaliza Avelar.
Serra só age assim porque sabe que a mal chamada "grande mídia" vai, como de costume, minimizar os fatos e fazer de tudo para "livrar sua cara" - e não só porque clara mas não assumidamente apoia sua candidatura à Presidência mas porque, dominada por uma plutocracia das mais retrógradas e atrasadas, abomina qualquer manifestação popular, ainda mais se levada a cabo por jovens estudantes que convivem com setores da futura elite do país.
Esse episódio de violência absolutamente desnecessária poderia ter, por incrível que pareça, um lado bom, que seria mostrar a verdadeira face de José Serra para o resto do país que ele sonha governar. Os moradores de outros estados poderiam ver, então, que o verdadeiro semblante do governador paulista não conserva qualquer espécie de relação com a imagem do economista polido e de fala didática, que a mídia usualmente mostra: como sucessivos episódios de violência oficial mostram, não passa de um truculento, de um elitista refratário ao diálogo; do que de pior e de mais retrógrado a política nacional tem a oferecer.
De administrador e tecnocrata eficiente Serra não tem nada - e basta morar em São Paulo para se certificar disso diariamente. Ele não passa, na verdade, de um sub-ACM sem o sotaque que o preconceito condicionou a associar ao coronelismo, o que tem impedido a máscara do cosmopolitismo de cair, trazendo à luz sua verdadeira face de coronel (veja porque a trajetória de Serra provoca medo).
Porém, para que a difusão da imagem do verdadeiro Serra percorresse o país seria necessário que ou a "grande mídia" resolvesse mostrar, subitamente, interesse em aprofundar-se no retrato de um episódio tão prejudicial ao candidato do PSDB, ou a internet - sobretudo a blogosfera - provasse que o poder que tem demonstrado de produzir contrainformações e de desnudar as falcatruas da "grande mídia" se estende à difusão massiva de informação. A primeira possibilidade é uma hipótese remota, quase inconcebível; a segunda, uma incógnita.
Caso nenhuma das alternativas venha a ocorrer, restará a utilização das imagens da violência da polícia comandada por Serra durante a campanha eleitoral, mas, fora desse contexto, a grave dimensão do ocorrido tende a se diluir sem maiores consequências. A elite paulista - e, o que é ainda pior, a classe média que pensa que é ou quer ser elite - vai, como de costume, aplaudir secretamente a violência contra "esses vagabundos" da mesma forma como ofereceu seu "silêncio sorridente" quando 111 seres humanos indefesos e sob a guarda do estado foram mortos. E, pelo verificado até agora na blogosfera, o grau de mobilização e indignação, embora presente, está longe do esperável, enquanto a alienação e o direitismo, mesmo entre jovens, proliferam.
Até que nos roubem a luz e arranquem a voz de nossa garganta.
Portanto, com esse inaceitável uso da violência contra jovens universitários indefesos, fica cabalmente demonstrado que "O Sr. José Serra não tem autoridade moral para ser Presidente da República Federativa do Brasil. Haja mãos e pés para contar os exemplos de truculência, autoritarismo e vocação ditatorial. Esse senhor simplesmente não sabe conversar com a sociedade civil" – finaliza Avelar.
Serra só age assim porque sabe que a mal chamada "grande mídia" vai, como de costume, minimizar os fatos e fazer de tudo para "livrar sua cara" - e não só porque clara mas não assumidamente apoia sua candidatura à Presidência mas porque, dominada por uma plutocracia das mais retrógradas e atrasadas, abomina qualquer manifestação popular, ainda mais se levada a cabo por jovens estudantes que convivem com setores da futura elite do país.
Esse episódio de violência absolutamente desnecessária poderia ter, por incrível que pareça, um lado bom, que seria mostrar a verdadeira face de José Serra para o resto do país que ele sonha governar. Os moradores de outros estados poderiam ver, então, que o verdadeiro semblante do governador paulista não conserva qualquer espécie de relação com a imagem do economista polido e de fala didática, que a mídia usualmente mostra: como sucessivos episódios de violência oficial mostram, não passa de um truculento, de um elitista refratário ao diálogo; do que de pior e de mais retrógrado a política nacional tem a oferecer.
De administrador e tecnocrata eficiente Serra não tem nada - e basta morar em São Paulo para se certificar disso diariamente. Ele não passa, na verdade, de um sub-ACM sem o sotaque que o preconceito condicionou a associar ao coronelismo, o que tem impedido a máscara do cosmopolitismo de cair, trazendo à luz sua verdadeira face de coronel (veja porque a trajetória de Serra provoca medo).
Porém, para que a difusão da imagem do verdadeiro Serra percorresse o país seria necessário que ou a "grande mídia" resolvesse mostrar, subitamente, interesse em aprofundar-se no retrato de um episódio tão prejudicial ao candidato do PSDB, ou a internet - sobretudo a blogosfera - provasse que o poder que tem demonstrado de produzir contrainformações e de desnudar as falcatruas da "grande mídia" se estende à difusão massiva de informação. A primeira possibilidade é uma hipótese remota, quase inconcebível; a segunda, uma incógnita.
Caso nenhuma das alternativas venha a ocorrer, restará a utilização das imagens da violência da polícia comandada por Serra durante a campanha eleitoral, mas, fora desse contexto, a grave dimensão do ocorrido tende a se diluir sem maiores consequências. A elite paulista - e, o que é ainda pior, a classe média que pensa que é ou quer ser elite - vai, como de costume, aplaudir secretamente a violência contra "esses vagabundos" da mesma forma como ofereceu seu "silêncio sorridente" quando 111 seres humanos indefesos e sob a guarda do estado foram mortos. E, pelo verificado até agora na blogosfera, o grau de mobilização e indignação, embora presente, está longe do esperável, enquanto a alienação e o direitismo, mesmo entre jovens, proliferam.
Até que nos roubem a luz e arranquem a voz de nossa garganta.
2 comentários:
Maurício,
Uma eleição de Serra para a Presidência da República seria um retrocesso brutal; quando FHC foi eleito em 94, mesmo que fosse para concretizar seu desastroso projeto alinhado com o Consenso de Washington, ele trouxe alguns avanços políticos em relação ao Governo Collor, por exemplo. A eleição de um Serra não, tem uma conotação totalmente diferente.
Serra, na sua infinita ambição, tenta convergir em si, um projeto autoritário, ainda difuso, que vem sendo desenhado ao longo do Governo Lula. O Brasil é um país estratégico para a América Latina e mesmo que o governo petista não tem trazido todos os avanços que poderia, possibilitou avanços políticos e econômicos do país e abriu espaço para eleições de governos de centro-esquerda e esquerda pelo continente. Isso foi péssimo para os EUA. Onde está a ALCA agora? Onde está o isolamento de Cuba?
Vivemos um época perigosa como foi a segunda metade dos anos 50; se por um lado o governo JK, com suas virtudes e defeitos, produzia avanços interessantes, nas áreas cinzas da política se conspirava, se armava. O embuste da UDN, incapaz de ser o partido institucional de representação dos administadores colonias (vulga burguesia brasileira), tramava-se a implosão do sistema. Deu na ditadura.
Agora Serra, vendo essas curiosas movimentações pelos porões da política nacional, Serra quer vestir a máscara do líder, do soberano. Uma vitória de Serra ano que vem representará uma derrota maior para a nação do que teria sido uma vitória sua em 2002. Reajamos.
Hugo, esse seu excelente comentário daria um belo post ou artigo acacêmico. Você toca em questões essenciais que têm sido negligenciadas tanto pelo atual zeitgeist esquerdista anti-mídia quanto pelo Fla-flu PT vs. PSDB/DEM.
Concordo que, com todas as muitas restrições que se possa fazer ao governo FHC, ele trouxe avanços político-institucionais, não tanto pelas práticas que o concernem diretamente nesse âmbito (onde encontramos anomalias como um Engavetador-Geral da União e a utilização da PF para fins políticos contra Roseana Sarney), mas pelo azeitamento das macroestruturas da democracia brasileira.
Assim como, mesmo que os críticos intransigentes de Lula insistam em não reconhecer, a política externa do atual governo foi extremamente hábil e inovadora e acabou – em consonância com a nova dinâmica mundial – a reposicionar o Brasil geopoliticamente de forma mais dinâmica e menos dependente, como você aborda.
Mas o ponto em que eu mais me identifico com seus comentários é quando afirma que “Vivemos um época perigosa como foi a segunda metade dos anos 50”. A louvável novidade da blogosfera tem produzido uma falsa euforia que, por sua vez, tem como efeito colateral o que Bourdieu, referindo-se à relação da sociedade com a mídia, chama de “amnésia estrutural” quanto ao perigo latente de uma contra-reação violenta das forças de direita, com o apoio da mídia. E Serra é, por ora, o nome que encarna esse projeto (aliás, é exatamente por essa razão que ele aliou-se a forças da pior direita e tornou-se ostensivamente truculento).
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