Qual o futuro da
política no Brasil? A resposta para esta questão, seja ela qual
for, aponta para o esgotamento e a necessidade de superação do
modus operandi político vigente no país ao menos desde o advento da
“Nova República” (1984).
Seu traço distintivo é
um tráfico de cargos e bens públicos, alegadamente em troca de
apoio político, mas que na prática significa a perpetuação, nos
níveis federal, estadual e municipal, da cultura estamentária de
que nos fala Raymundo Faoro, protagonizada por politicos parasitários
que sugam e tiram proveito privado do Estado.
Mercado de pulgas
Tal escambo do bem
público tem sido a prática politica padrão de todos os partidos
que se revezaram no poder desde a redemocratização. Só muda o
rótulo: “balcão de negócios” na época do PMDB de Sarney,
“toma-lá-dá-cá” com FHC e os tucanos, “realpolitik” na era
petista de Lula e Dilma.
A recente fala pública
de Aloizio Mercadante anunciando, sem o mínimo pudor, que o segundo
escalão será preenchido por quem votar com o governo é a coroação
dessa baixa politica, em que cargos técnicos e de comando – que
deveriam ser ocupados pelos especialistas mais dotados e capazes –
viram mera moeda de troca por um voto no Parlamento. E tal voto -
que, por sua vez, deveria se dar em consonância com a consciência,
a convicção e o alinhamento ideológico, político e partidário do
parlamentar - é trocado por um cargo bem remunerado e de algum
prestígio. Como se de uma mera relação comercial se tratasse.
Danos de monta
É imenso,
incomensurável o atraso que tal prática politica acarreta ao país, cuja
condução fica a cargo de pessoas não apenas despreparadas, mas
ávidas por ganhos pessoais advindos de sua posição privilegiada; à
democracia, que já carece de partidos programáticos e
ideologicamente coesos; e à deteriorização da visão pública que
se tem da política, como antro de sujeira e de corrupção.
Essas mais de três
décadas de polticas de gabinete, entre a chantagem parlamentar e o
suborno do Estado, tornaram a própria política brasileira
anacrônica. E esse atraso não diz respeito apenas a instituições,
e sim às relações entre arena pública, democracia e ação
politica, em todas suas potencialidades. No bojo de tal processo –
que o poder quer imutável – são mínimas e negligenciadas as
formas efetivas de participação política e de democracia direta; a
incorporação efetiva de uma pauta biopolítica que supere o
meramente econômico e abarque, como prioritárias, as demandas
comportamentais, corpóreas, sanitárias, educacionais, ambientais,
recreativas – bem como a promoção efetiva dos direitos humanos de
quarta geração.
Esgotamento
Mas, por outro lado, há
um claro esgotamento público para com a corrupção, açulado por
grandes processos em que Justiça e mídia desempenham um papel
central, como o Mensalão e a Operação Lava-Jato. Para além das
questões de justeza, de tratamento desigual entre escândalos
tucanos e escândalos petistas, de teorias conspiratórias variadas
sobre golpes e contragolpes, o fato é que a tolerância para com a
corrupção acabou e que esta, neste momento, mostra-se profundamente
associada, no imaginário político brasileiro, ao PT.
PT cuja guinada
violenta à direita, hoje simbolizada pelo estelionato eleitoral em
curso, não é fato recente, decretado pelas consequências da
traição eleitoral de Dilma. Trata-se de um processo, que começou
efetivamente lá atrás, na primeira eleição de Lula, com
concessões sucessivas ditadas por uma realpolitik cada vez mais
elástica e amoral - que seria temerariamente esticada, ao longo dos
anos, por alianças do PT com personagens como Jader Barbalho, Collor
e Maluf.
Corrupção moral
Tal processo agravou-se
com o primeiro mandato de Dilma, que - como este blog documentou
desde o início – teve na ampliação da hegemonia política via
concessões ao conservadorismo o seu principal norte político. Uma
dinâmica cujo fim seria – como alertamos diversas vezes entre 2011
e 2014 – o desequilíbrio do pêndulo da política brasileira para
o espectro centro-direita, com o esvaziamento político, eleitoral e
programático da esquerda.
O que se vê hoje em
dia é apenas o bagaço dessa laranja: o petismo tanto cedeu à
direita que terminou sua presa, praticando, neste momento, a mesma
velha política neoliberal da era FHC, cortando na carne de
trabalhadores e desempregados para fazer altos superávits primários
e agradar ao mercado financeiro. Se a corrupção financeira é ainda
por alguns ingênuos ou fanáticos questionada, a corrupção moral
torna-se evidente.
Covardia e conformismo
E setores que poderiam se contrapor, à esquerda, a esse quadro, preferiram, nas últimas eleições, apostar no medo - já covarde e artificialmente inflado pelo marqueteiro oficial -, confortavelmente insistindo na leniência para com o retrocesso petista, que já era mais do que evidente.
Pois que Dilma tenha se reeleito graças ao decisivo “voto crítico” de psolistas e demais setores que se dizem de esquerda é uma prova precoce – mas contundente – não só da miopia e má formação política dessa pretensa vanguarda, mas que ela não é coerente com as demandas de renovação das práticas politicas no país. Continua presa aos padrões convencionais e mercantilistas da política. Um museu de grandes novidades, como disse o poeta.
Pois que Dilma tenha se reeleito graças ao decisivo “voto crítico” de psolistas e demais setores que se dizem de esquerda é uma prova precoce – mas contundente – não só da miopia e má formação política dessa pretensa vanguarda, mas que ela não é coerente com as demandas de renovação das práticas politicas no país. Continua presa aos padrões convencionais e mercantilistas da política. Um museu de grandes novidades, como disse o poeta.
Horizontes
Portanto, a resposta à
pergunta que abriu este texto – qual o futuro da política no
Brasil? - não virá desse campo minado, desses políticos de
discurso ora nuançado, ora agressivo de esquerda mas de postura invariavelmente
retrógrada quando o tema é segurança pública, drogas ou
sexualidade.
Os termos de tal
resposta nos é permitido apenas intuir; só o futuro dirá se a atual crise
do país acabará por impor mudanças de monta ou a agravar ainda
mais o retrocesso. Por ora podemos apenas afirmar que a renovação
da política no Brasil passa, necessariamente, por um lado, pela
horizontalização do debate popular e pelo salto qualitativo no
exercício da cidadania; e, por outro, pela reformulação dos
partidos e pelo fim do aparelhamento e loteamento do Estado a cada
troca de siglas no poder. Que forças serão capazes de se incumbirem
de tamanha tarefa só a própria população brasileira poderá
determinar.
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