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quinta-feira, 6 de maio de 2010

Serra como o "pós-Lula", ou o cinismo como marketing eleitoral

A tentativa de José Serra de “vender-se” como o pós-Lula, elogiando publicamente e com frequência o atual presidente, embora não deixe de apresentar aspectos risíveis, põe em prática uma das operações de marketing político mais cínicas da história das eleições brasileiras.

Ofensiva ao eleitorado brasileiro - ao qual trata como um ignorante político e um desmemoriado - o oportunismo de Serra no episódio, demeritório para si próprio e para seu passado, equivale a uma desautorização pública de seu partido - que vive, há 8 anos, às turras com Lula.

Se tivéssemos uma imprensa de fato, com um mínimo de vergonha na cara, ela estaria hoje desmascarando essa farsa, com a arma do sarcasmo que tal fanfarrice demanda e com o amplo apoio dos arquivos e dos fatos, sejam estes bem recentes (quando o candidado tucano era governador de São Paulo) ou distantes (referentes ao longo antagonismo não só entre PT e PSDB, mas, incluindo embates eleitorais, entre as figuras de Lula e de Serra).

Porém, em relação a tamanha hipocrisia, os colunistas de política da “grande imprensa”, sempre tão moralistas, fiscalizadores das mínimas derrapadas verbais dos políticos com os quais seus patrões antipatizam – notadamente o presidente Lula e a candidata Dilma Rousseff -, ostentam um silêncio tão sepulcral quanto epifânico.


Dois pesos, duas medidas
Compara-se a reação desses mercenários do jornalismo com a que tiveram quando o PT passou a flexibilizar suas alianças e orientação política - rumo a um neoliberalismo menos ortodoxo do que o então praticado pelo PSDB – para se ter uma idéia dos reais valores (ou dos valores em reais, como queiram) que regem suas opiniões. Não que a “lulização de Serra” e a “neoliberalização do PT” sejam equivalentes: esta, sem deixar de ser eventualmente criticável, representa um processo de correção de rumo face às condições históricas vivenciado por um número significativo de partidos políticos (como as sociais-democracias européias e o trabalhismo inglês, para ficar em dois exemplos óbvios), enquanto a metamorfose de Serra em admirador de Lula pertence a outra ordem de coisas: a das farsas grotescas.

E não basta invocar a estratégia “Lulinha paz e amor”, proposta por Duda Mendonça e posta em prática pelo candidato petista em 2002, para autorizar a estratégia serrista de marketing, não só porque até tal estratagema o candidato tucano copia – por meio da tal campanha da “meiguice” -, mas porque suavizar o discurso, como o hoje presidente fez, é bem diferente de negar não apenas o próprio passado mas o do partido ao qual é filiado, e passar a forçar a barra para uma identificação com o líder do partido opositor. Seria como se Lula tentasse fingir concordar com Fernando Henrique Cardoso em 2002 – o que nunca fez, até porque, com a popularidade que o ex-presidente tinha, seria um péssimo negócio.


"Última esperança branca"
Se quer ganhar a eleição, Serra não tem mesmo outra alternativa: identificar-se como o tucano que é significa evidenciar sua filiação ao legado de FHC, a quem o povo brasileiro detesta, por conta de seu governo anti-povo, privatista, recessivo, no qual o desemprego bateu recordes (atualmente continua a batê-los, mas em sentido inverso: o de março foi o menor da história desde que o índice começou a ser medido).

Não ter alternativas não é, no entanto, justificativa para a manutenção dessa pantomima ofensiva à democracia. A decência pede, com mais ênfase aos homens públicos, que assumam o seu passado e suas posições político-ideológicas, mesmo que à custa de eventuais sacrifícios eleitorais.


Olho vivo
Denunciar a farsa grotesca do Serra lulista - e enfatizar seus laços com FHC e com o neoliberalismo ortodoxo, inclusive no passado recente como governador paulista - deve ser a prioridade número um da candidatura de Dilma. Isso se também esta não se vir vítima do “tapetão” judiciário ao qual o PSDB tem sistematicamente apelado – e o qual pede redobrada atenção da sociedade civil quanto aos procedimentos da Justiça Eleitoral.

Pois, segundo os jornais de hoje, o programa de TV do PT pode, se o TSE acatar o entendimento da procuradora Sandra Cureau, não ir ao ar devido às acusações que fez ao governo FHC de “só ter governado para os ricos” (ué, cadê os defensores histéricos da liberdade de imprensa agora? sumiram?). Ora, se isso for suficiente para vetar o horário petista, a transformação de Serra em lulista desde criancinha serve com folga ao impedimento do horário tucano. Basta acessar os arquivos e rodar o VT.

10 comentários:

Cristian Korny disse...

eu ainda acho que essa manipulação toda não funciona, todo mundo vê a bílis no sorriso "meigo" de Serra, e aposto que vão escolher a realidade não essa fantasia do marketing e das redações.

Unknown disse...

Cristian,

Eu também acho que não funciona. Mas nunca vi tanta e de forma tão orquestrada.

Unknown disse...

Nova embalagem para produto conhecido funciona sim, no caso do Serra infelizmente. Já disse pra quem me consultou que a comparação da história de ambos, migrantes, pobres, perseguidos, obstinados etc só cola se Lula fosse tipo o FHC que não "apoiou" Serra e Alckmin. Lula terá de desmontar a colagem trazendo o foco para Dilma. Mas se essa estratégia correr solta, pode pegar sim.

Unknown disse...

Luiz,

Era isso o que eu temia ouvir... ainda mais vindo da boca de um especialista.

Anônimo disse...

A imprensa em silêncio, frente à mais nova mistificação do Simpatia Serra? Antes fosse! Eles estão é elogiando!

Eduardo Prado disse...

Seguindo o raciocínio do Joel,

A imprensa não só está elogiando como está ajudando a construir a imagem do Serra como o pós-Lula, como alternativa para o futuro.

Se vai colar ou não, só o tempo vai dizer, mas acho pouco provável que o povão se deixe levar. Tudo vai depender de como a campanha da Dilma vai reagir a isso. Garantir a vitória vai exigir muito do PT, pois a mesma imprensa que constrói a imagem de Serra vai tentar de tudo para desconstruir a imagem de Dilma.

Unknown disse...

Joel e Eduardo,

É vergonhosa a atuação da imprensa. Prova, uma vez mais, que é necessário uma política de comunicação ativa que reaja a esse desvirtuamento das funções da mídia, as quais se recusa a cumprir.

Eu também acho que não cola, mas que é uma vergonha e uma afronta à plena democracia, é.

Gildo Araújo disse...

Então estamos combinados, na próxima e futuras eleições basta verificar quem é o candidato mais odiado pela grande mídia e sempre votar nele. Muito obrigado, mas prefiro pensar com os meus próprios neurônios.

Gildo Araújo disse...

Então estamos combinados, na próxima e futuras eleições basta verificar quem é o candidato mais odiado pela grande mídia e sempre votar nele. Muito obrigado, mas prefiro pensar com os meus próprios neurônios.

iolandaster disse...

EU TEMO PELA ELEIÇÃO DO ET-SERRA! SE ELE GANHAR ESTAMOS MAIS UMA VEZ A MERCÊ DO FMI E OUTRAS "COSITAS MAS"!