O escândalo de
corrupção da Petrobras toma proporções cada vez mais graves à
medida que o teor das delações premiadas começa a vir à tona,
revelando uma teia de envolvidos e um modus operandi que,
com pequenas ressalvas, sugerem um novo “Mensalão”, mais
descarado e em maior escala.
Com o depoimento da
ex-gerente Verina Velosa, as acusações chegam à alta cúpula da
estatal, atingindo diretamente a presidente Graça Foster, a qual
Dilma Rousseff teima em manter no cargo, a despeito do enorme
desgaste para a imagem e o desempenho mercadológico da empresa.
Liberou geral
Além de ativar contra
Verina a máquina de desconstrução do partido, tão atuante nas
últimas eleições, a resposta-padrão do petismo, repetida por
blogueiros “progressistas” e por Carta Capital -
que cada vez mais se assemelha a uma Veja chapa-branca
- tem sido que o escândalo
envolve políticos de todos os partidos. Trata-de de meia verdade, a
serviço de uma empulhação completa.
Meia
verdade porque, dos 28 nomes elencados pela delação de Paulo
Roberto Costa, só um não pertence à base aliada (Sérgio Guerra,
do PSDB; o ex-governador Eduardo Campos, à época das denúncias,
ainda pertencia). O tucano, tudo indica, é a exceção que confirma
a regra, pois o PT e o PMDB têm, cada um, oito nomes citados e o PP
do aliado Maluf, 10. Mais: não há menção a nenhum político do
PSOL ou dos demais partidos à esquerda.
E
se trata de empulhação integral porque a (falsa) premissa implícita
em tal resposta-padrão é: se todos roubam, então o PT e seus
aliados não podem ser punidos. Locupletemo-nos todos e viva a
impunidade!
Cadeia de comando
Tal
presunção não se sustenta nem ante a Justiça nem ante a Ética –
as quais pressupõem que todos os envolvidos em corrupção têm de
responder por suas trangressões legais. Pior: ignora o fato de que a
responsabilidade pela administação da Petrobras, estatal nacional
de economia mista, cabe sobretudo ao governo federal, acinista
majoritário, ao qual a empresa está subordinada e que é o
responsável pela nomeação de presidente e diretores e por
assegurar que as linhas-mestras ditadas para as áreas de
biocombustível e tecnologia sejam por eles cumpridas a contento e
com lisura.
E o
governo federal está, há mais de uma década, a cargo de uma
aliança capitaneada pelo Partido dos Trabalhadores – tempo mais do
que suficente para conhecer bem sua maior e principal empresa e
identificar os desvios milionários causados por um esquema de grandes
dimensões, envolvendo planejamento, maquiagem de contas e dezenas de
políticos próximos, em um verdadeiro achaque contra os cofres
públicos.
Ao invés disso,
prefere, a despeito dos vários alertas enviados à presidência da
estatal denunciando o golpe, simular total desconhecimento,
sustentando uma pouco crível argumentação segundo a qual um
esquema que teria beneficiado 27 membros do alto escalão da base
aliada fosse desconhecido pela presidente da empresa, pela cúpula
dos partidos envolvidos e pela presidente da República, cuja
familiariedade com meandros da administração petrolífera inclui
não apenas seus dois anos e meio à frente do ministério das Minas
e Energia, mas a chefia do conselho da Petrobras até 2006.
Bode expiatório
Outro
estratagema petista para tentar desqualificar as denúncias do
Petrolão é alegar que a mídia as destaca com furor, enquanto pouco
ou nada fala dos escândalos protagonizados pelo PSDB, notadamente o
maior deles, o “Metrolão” paulista, envolvendo 18 empresas e
contratos suspeitos que somam mais de R$ 400 milhões.
Trata-se,
de modo geral, de uma crítica procedente, que se refere a um grave
problema da mídia brasileira. Mas mesmo em relação a isso o PT tem
sua parcela de responsabilidade, pois, se não tivesse se acovardado e
recuado de seu projeto de constituir um novo marco regulatório para
a mídia, talvez a questão estivesse encaminhada. Mas não: parece
ser cômodo para o partido que a militância berre histericamente
contra o “PIG”, enquanto os cofres da Secom acariciam os bolsos
dos magnatas das comunicações e Dilma faz omelete com Ana Maria
Braga.
De
qualquer modo, efetiva, a assimetria de tratamento que a mídia
dispensa aos escândalos de um e de outro partido deve como tal ser
denunciada e combatida. Mas ela não constitui, de modo algum, uma
justificativa para que os escândalos de corrupção petistas deixem
de ser investigados, como insinuam parte dos militantes. Pelo
contrário: o que ela evidencia é a necessidade de isonomia de
tratamento para a corrupção, provenha de onde provier, e de atenção a casos que recebem menos atenção da mídia, sem prejuízo
do rigor para com qualquer caso
de corrupção. O contrário disso é leniência e omissão –
práticas tornadas lugar comum no governo Dilma, que ainda por cima, em relação ao Petrolão, quer faturar como seus os louros da investigação conduzida, por iniciativa própria, pelo Ministério Público e pela Polícia Federal.
Corrupções
várias
O
tempo talvez tenha embotado a memória de muitos, mas, há doze anos,
a promessa de renovação que alçou o PT ao poder incluía não
apenas um novo pacto social - com combate à pobreza via programas
governamentais e inclusão de minorias via sistema de cotas -, mas um
compromisso de lisura ética no trato da coisa pública, em
consonância com o papel que o partido desempenhara junto ao
Ministério Público e nas denúncias dos casos de corrupção dos
governos Sarney, Collor e Fernando Henrique.
A Carta ao Povo
Brasileiro, assinada pelo candidato Lula na reta final da campanha de
2002, serviu para tranquilizar o mercado e frear os ânimos
anticapitalistas que até então moviam parcelas do petismo, mas,
como demonstrou com propriedade o economista José Paulo Kupfer, ela
se limita a firmar um compromisso de respeito às regras gerais de
funcionamento do mercado. No entanto, nem mesmo nas entrelinhas,
permite que se confunda a concordância com tais normas com renúncia
a aperfeiçoá-las, a manipulá-las a fim de se alcançar objetivos
políticos sem transgredi-las ou a combater seus efeitos colaterais –
dos quais a corrupção é o mais evidente.
No governo, o modo de
operar foi bem outro, e à realpolitik por demais elástica
dos primeiros tempos chegamos, através da nomeação de Joaquim Levy
ao ministério da Fazenda, à rendição ao mercadismo mais abjeto,
tão criticado na recente campanha eleitoral, que o petismo, em sua
ânsia irrefreada pelo poder a qualquer custo, transformou na mais
suja da história do país. Se o golpe na mais simbólica e
historicamente mais relevante empresa do Brasil – hoje reduzida, na
melhor das hipóteses, à metade de seu valor de quatro anos atrás, num caso claro de ma gestão –
marca o ápice da corrupção na era petista, a nomeação de Levy e,
a confirmar, a de Kátia Abreu, são a expressão do grau de
corrupção moral da aliança governista, descomprometida com
qualquer coerência ideológica ou programática.
Exercicio mental
Isso
posto, para encerrar, convido o leitor ou a leitora a fazer um
exercício de projeção: imagine que um político tucano estivesse
há 12 anos na Presidência e, além de não ter o mínimo pudor de
trair os compromissos de campanha, fosse descoberto, durante seuu
governo, um enorme caso de corrupção numa estatal, em que tivesem
sido surrupiados no mínimo R$30 bilhões do povo brasileiro em prol
dos bolsos dos aliados do poder. Qual seria a reação do petismo?
(Imagem retirada daqui)
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