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terça-feira, 15 de outubro de 2013

Dilma, Marina e as eleições

O combate à pobreza e a economia popular devem ser os dois grandes trunfos da candidata Dilma Roussef nas próximas eleições. Serão suficientes para assegurar um segundo mandato? Até o momento as pesquisas dizem que sim, até com uma certa folga, mas é muito cedo para um prognóstico: os protestos nas ruas são um fator potencial de desestabilização, tanto uma eventual participação de Joaquim Barbosa (que, como juiz, tem até abril para se lançar candidato) quanto a chapa Eduardo Campos e Marina Silva podem apresentar surpresas (tanto em relação a quem será o candidato quanto em seu verdadeiro potencial eleitoral), e o jogo, pra valer, só começa em meados do ano que vem.

Os programas de inclusão social são hoje reconhecidos pela maioria como essenciais, política de Estado, mas o cenário econômico suscita preocupações: os juros estão novamente lá em cima, o crescimento será, pelo segundo ano consecutivo, muito baixo e a inflação só se mantém no topo da meta graças a uma tremenda manipulação dos impostos dos produtos e dos preços dos bens e serviços públicos que mais pesam na constituição do índice. Parte desse desempenho decorre de um cenário internacional em crise, mas parte é consequência das barbeiragens da política econômica da era Dilma, pois, fora da Europa e dos EUA, há economias com um desempenho bem mais sólido que o brasileiro, inclusive entre seus vizinhos latino-americanos.



A importância da percepção
Acontece que o governo tem sido bem-sucedido em minimizar os efeitos da crise tal como percebida pela população, e isso tende a ser mais importante do que as narrativas econômicas que o mercado financeiro forjou no início do neoliberalismo - como sua sua primazia obsessiva pelo superavit primário - e que seguem como parâmetro orientador das políticas oficiais, inclusive nos governos petistas.

Tal percepção gera uma mudança fundamental: no passado, os reflexos das crises econômicas foram vivenciados na carne pela população, sobretudo a mais pobre, como recessão, ou seja, atividade econômica deprimida e falta de dinheiro no bolso; agora, pode-se até ter, eventualmente, a percepção de que a economia não vai tão bem, mas - até pela maior disponibilidade de crédito - os bolsos não estão vazios. Numa eleição, isso pode fazer toda a diferença.

Por isso mesmo, soa pouco proveitosa a estratégia inicialmente adotada por Marina, de mirar na economia para tentar minar a candidata favorita, sua desafeta, contra a qual travou surdas batalhas nos sete anos em que foi ministra do Meio Ambiente, tentando em vão se contrapor ao desenvolvimentismo estilo "Brasil grande" da hoje presidente. O estilo trator de Dilma falou mais alto ao instinto político de Lula, árbitro da peleja e fiador da atual mandatária.



Ditames do mercado
Ao atacar a condução da economia no governo Dilma, defendendo a volta do "tripé de sustentação" tão ao gosto do mercado – câmbio flutuante, rigor fiscal e metas de inflação – Marina desequilibra ainda mais à direita o pêndulo ideológico da próxima eleição presidencial e facilita tremendamente a tarefa de Dilma como candidata, já que esta fica sem concorrente competitivo à esquerda, que lhe cobre explicações pelo tratamento dispensado aos índios, por um índice de apropriação de terras para reforma agrária ainda menor que o de FHC, pela presença da Força Nacional em Belo Monte, pelo tratamento truculento dispensado a grevistas, pela ausência de diálogo com os movimentos sociais (que, não fosse a reação provocada pelos protestos de junho, seria nenhum), pela leniência com as teles, pelo lucro pornográfico dos bancos e pela volta das privatizações, entre tantas outros áreas que regrediram no governo Dilma.

Mantido o atual cenário, teremos uma candidatura ansiosa por uma "reforma" que restaure a ortodoxia neoliberal (Aécio), outra que promete um "desenvolvimentismo responsável" (Marina/Campos), ou a reeleição de uma presidente que só afrouxou o arrocho fiscal a contragosto e a partir do terceiro ano de governo (depois de tê-lo apertado ainda mais), não hesitando, porém, em promover a volta disseminada das privatizações – a base do receituário neoliberal -, inclusive do petróleo, em franca contrariedade com o que a esquerda brasileira e o PT sempre defenderam e com o que, como candidata, Dilma se comprometera na eleição anterior.



Vácuo
Ou seja, nenhuma candidatura competitiva à esquerda, que tenha a coragem de questionar os parâmetros macroeconômicos determinados pelo mercado financeiro e denunciar que conceitos como rigor fiscal e déficit público são uma "construção ideológica feita sob medida para enquadrar uma economia periférica", como definiu Bernardo Kucinski (Ed. Unesp, 2002, p. 126) em um momento em que se acreditava que o PT libertaria o país desse "entulho neoliberal".

Que tenha o destemor de realmente colocar Educação e Saúde à frente dos interesses do mercado.

Que proponha um modelo de desenvolvimento que não leve ao genocídio dos índios nem ao caos urbano e estético da vida nas cidades.

Que respeite o direito constitucional à greve e mantenha as portas do poder abertas ao diálogo e à negociação com os movimentos sociais.

Que realmente atente para as demandas de todos os brasileiros, inclusive dos que não professam religião alguma e/ou vivenciam uma sexualidade fora dos limites da heteronormatividade, sem sujeitá-los às consequências de um conluio entre religião e política que a laicidade do Estado deveria vetar.

Que renegue o derrotismo implícito e o explícito entreguismo de se privatizar os portos, as estradas, o petróleo, maior riqueza mineral do país pelo qual o povo brasileiro lutou com o próprio sangue.


Herança maldita
Todas e cada uma dessas proposições são hoje uma quimera. Após mais de uma década de PT no poder, o cenário eleitoral que se delineia para o país em 2014 apresenta três ou quatro candidatos que oscilam do conservadorismo assumido ao economicismo envergonhado, sem espaço para um candidato competitivo de esquerda. Parabéns, lulismo! Vocês conseguiram.



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