O vazamento do
inquérito do caso Cacheira-Demóstenes, ao permitir acesso a uma
série de evidências acerca de ações coordenadas pelo bicheiro
visando fabricar e plantar escândalos na mídia, dirime dúvidas
sobre a gravidade das acusações e o grau de envolvimento da
imprensa numa operação que, de maneira indubitável, possui viés
golpista, atentando contra a ordem constitucional.
Por outro lado, demarca
o início de uma nova fase em que devem acirrar-se tanto as
estratégias diversionistas dos setores beneficiários de tal esquema
– leia-se demotucanato e mídia - quanto o confronto entre as
versões que esta, acuada e prestes a sentar-se no banco dos réus,
deve, com propósitos ilusionistas, oferecer e os fatos que se
depreendem das evidências colhidas nos autos.
Vazamento suspeito
Uma primeira questão a
ser pensada é a quem interessa o vazamento de um inquérito que
tramitava em segredo de justiça e com que finalidade ele foi
divulgado. Segundo o STF - que tornou pública a irritação que a
divulgação indébita causou ao ministro relator Lewandowski e ao
presidente Aires Britto, que teriam se reunido por cinco horas para
discutir o caso -, além de membros da corte, só os advogados de
acusação e de defesa haviam tido acesso ao processo . (Nota: ao contrário do que alguns analistas ora afirmam, quando Lewandowski liberou o acesso de membros da CPI ao inquérito, na sexta-feira, este já havia vazado e era passível de acesso em diversos sites.)
Afigura-se como mais
provável hipótese que o vazamento advenha do campo da defesa, com
vistas a pavimentar o caminho para anular o caso. Há um precedente
para a adoção bem-sucedida de tal estratagema: a Operação
Satiagraha – que, não por acaso, também dizia respeito a um
enorme e ramificado conluio entre poder político-econômico e
manipulação midiática.
Para muito além do Fla-Flu
Porém, os tempos no
STF são outros, agora que conta com a liderança serena e segura de
Ayres Britto, e parece pouco provável que o tribunal vá permitir
que uma chicana tão barata alcance, uma vez mais, êxito. Ainda
assim, a divulgação do inquérito – que absolutamente não
interessa à acusação, que dispõe de fartas evidências
comprovatórias – beneficiaria a defesa ao propiciar a deflagração
de um cenário de ânimos exaltados em que a violação da lei pelos
réus passasse ao segundo plano, substituída por uma nova edição,
mais acirrada, do Fla-Flu político-ideológico entre apoiadores da
aliança petista e de seus adversários demotucanos.
Uma primeira amostra de
tal tática foi dada na tarde de ontem (28/04), por ocasião da
reação ao tuitaço (mobilização através da rede social) que
colocou a hashtag #VejaGolpista no topo dos assuntos mais comentados
no Brasil e no mundo. Horas depois, a reação conservadora, embora
sem lograr o êxito de seus opositores, viria com a tag #VejaNelles,
que entrou para o TT Brasil.
Ora, os fatos vazados do processo trazem evidências que comprovam não ser mais possível – se é que um dia foi – limitar a tal falsa dicotomia os termos do debate público. O que está em jogo, agora, não são as inclinações político-partidárias dos cidadãos e seu agrupamento em torcidas opostas, a se digladiar, mas a existência – corroborada em uma montanha de provas - de um milionário esquema criminoso com ramificações públicas e privadas, nas três esferas do poder e - , talvez o mais grave - que manipulou, plantou matérias e as editou em pelo menos um grande veículo de imprensa, com consequências tão graves para a ordem democrática do país que o impeachment de um Presidente da República eleito chegou a ser cogitado.
Ante tais fatos, não
importa se o leitor ou a leitora simpatiza com o PT de Lula e Dilma,
com o PSDB de FHC e Serra ou com quaisquer outras figuras e partidos
da fauna política brasileira. A ordem jurídica do país e a
obediência à Constituição – para não mencionar a ética cidadã
- estão acima de tais predileções. Graves crimes foram cometidos e
precisam ser punidos, doa a quem doer. Simples assim.
Provas falam por si
Transformar um caso
jurídico dos mais estarrecedores, apoiado em farta documentação,
em uma mera guerrinha de torcidas só interessa aos réus e à mídia,
que, tem, pela primeira vez em nossa história, um alto volume de
provas contra si reunidas em um processo judicial. Essa politização
barata lhes fornece munição para ampliar sua cortina de fumaça,
caracterizando o caso – como já vêm fazendo – como mais um
round entre “os defensores
da imprensa livre” de um lado, e, de outro, “os agitadores/a
militância paga/os blogs sujos”, “que defendem a censura/que
querem encobrir o mensalão/que são chapa-branca” e por aí vai -
sempre de acordo com a cartilha de estereótipos com que tipifica os
que aos interesses da mídia se opõem.
Por isso mesmo, há de
se refletir se o momento é mesmo de manifestações ruidosas - que
tendem a facilitar tremendamente a tarefa diversionista midiática de
circunscrever o caso à militância política de esquerda, caracterizando-a como massa de manobra e sobrepondo o aspecto político do caso à sua natureza jurídica -, ou se a
hora é de reafirmar, serenamente e sem recair no Fla-Flu e na
provocação dos trolls, o primado da Justiça e a força dos fatos
apurados pela Polícia Federal e descritos nos autos.
Guerra de informação
De qualquer modo, o
maior desafio, agora, será difundir a real dimensão do caso para
além dos limites das mídia corporativa, fazendo com que as parcelas
mais conservadoras do público, tanto em termos das formas como
buscam ou recebem informação quanto de posicionamento político,
tomem ciência da ameaça à ordem democrática que, efetivamente,
tem significado o conluio entre crime organizado, políticos da
oposição e imprensa.
Neste momento, carregar ideológica e partidariamente as denúncias é contraproducente, assim como, é mister reconhecer, limitar sua difusão aos circuitos alternativos de comunicação - não obstante o importante papel destes - é insuficiente. Será preciso alcançar o leitor/ouvinte/espectador não familiarizado com blogosfera e redes sociais e fazê-lo tomar conhecimento dos crimes relatados nos autos. Trata-se de um desafio hercúleo - posto que setores da própria mídia farão de tudo para impedir ou deturpar a circulação de tais notícias -, mas necessário.
Atualização (20h16min): A Record, ao noticiar em seu portal, com o máximo destaque, que "Serra deu R$34 milhões à revista Veja quando era governador de SP" dá mostras de que nem toda a mídia sucumbirá ao diversionismo corporativo.
(Imagem retirada daqui)
Um comentário:
Veja, Folha e Globo contra você http://noticias.r7.com/blogs/o-provocador/2012/05/02/veja-folha-e-globo-contra-voce/ O assunto é sério. E é hora de todo cidadão honesto ficar alerta.
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