Assalto ao Banco Central vem competindo com blockbusters do cinema norte-americano não só na bilheteria mas na alta resolução técnica, verificável sobretudo no admirável desenho de som. Poderia, além disso, ser um bom filme e um entretenimento de primeira linha.
O que impede que o longa nacional logre tal sucesso é, acima de tudo, a “Síndrome de Tarantino”, a mania de fragmentar excessivamente o roteiro em avanços e retrocessos na narrativa - que, embora não tenha sido inventada pelo diretor de Pulp Fiction, tornou-se marca recorrente de contemporaneidade após o sucesso mundial de seus filmes.
Tal recusa à narrativa cronológica linear, somada ao artificialismo e falta de fluência da montagem, cobra um alto preço ao filme dirigido por Marcos Paulo, tendo como principal efeito o engessamento e esvaziamento emocional da narrativa – algo extremamente danoso para um pretenso thriller.
Deve-se registrar, a favor dos roteiristas, que a transposição às telas do maior roubo já ocorrido em solo nacional colocava uma relevante dificuldade inicial: o público estava ciente de que a operação fora bem-sucedida, não haveria como surpreendê-lo por aí. Ainda assim, se, ao invés de macaquear a fragmentação narrativa pós-moderna, os roteiristas de Assalto ao Banco Central prestassem mais atenção a filmes clássicos sobre roubos – como O Segredo das Jóias (The Asphalt Jungle, John Huston, EUA, 1950) ou O Grande Golpe (The Killing, Stanley Kubrick, EUA, 1956) -, ou mesmo a passáveis thrillers recentes – como Um Plano Brilhante (Flawless, Michael Radford, Reino Unido/Luxemburgo, 2007), em que Demi Moore e Michael Caine assaltam milhões em diamantes nos anos 60 – talvez se dessem conta da primazia do suspense e da emoção numa narrativa com tal tema.
Ao negligenciarem tais aspectos em prol de uma roupagem moderninha, fazem uma abordagem rasa de um tema profícuo, um roubo que, em plena era da vigilância eletrônica, levou R$160 milhões dos cofres federais – dos quais, a despeito da prisão da maioria dos envolvidos, só R$ 24 milhões foram recuperados. Tal trama real que tem não só desdobramentos dignos de grande história, de um thriller vibrante, mas evidente potencial metafórico, um ethos inerente à ação e seus desdobramentos, tanto no que concerne à denúncia do grau de deterioração moral de nossa sociedade – incluindo, com destaque, escalões do poder e autoridades policiais – quanto, em um âmbito mais amplo, ao velho embate entre a cobiça humana e mecanismos sociais de controle do capital.
Tudo isso fica, na melhor das hipóteses, apenas insinuado em Assalto ao Banco Central, caso típico de filme em que o elenco está muito acima da mise en scène, desperdiçado em uma representação por demais esquematizada: Lima Duarte e Giulia Gam estão soberbos como os policiais federais caxias e honestos; a trupe dos bandidos é reforçada por atores de grande personalidade cênica – como Gero Camilo e Tonico Pereira -, e, uma vez mais, Hermila Guedes (de Um Céu de Suely) rouba a cena, desta feita como a femme fatale gerando tensões no interior do bando. Além, é claro, do protagonista Milhem Cortaz – uma espécie de Victor Mature brazuca - como o implacável Barão, retrato de um bandido tão assustador quanto, por suas ligações com o poder oficial, real e convincente.
Após a experiência morna de assistir a Assalto ao Banco Central, resta aguardar pelo documentário sobre o roubo, a ser lançado por Luciana Burlamaqui, que teve acesso às investigações e tem horas e horas de material gravado, conforme anunciado pelo ótimo blog do crítico Carlos Alberto de Mattos. Não será surpresa se o resultado do doc superar o da ficção milionária.
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