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quinta-feira, 23 de setembro de 2010

O grito dos desesperados

O expressionismo foi um movimento surgido no final do século XIX, interessado em denunciar o estado psicológico de uma sociedade em que professores, alunos e qualquer um que protestasse, mesmo pacificamente, era surrado pela polícia a mando do governador.

Nascido na confluência da psicanálise e do darwinismo, interessava também ao expressionismo o retrato, em pinceladas fortes e tons escuros, da neurose urbana de uma época marcada pela aceleração do tempo - a não ser na Vila de São Paulo, onde blusas misteriosas faziam o Metrô parar, obriando as pessoas a caminhar sobre os trilhos.

Encimando este post está aquele que costuma ser considerado o quadro expressionista mais famoso: "O Grito", de Eduardo Mänco. Como podemos observar, a obra retrata o desespero (existencial, mental, eleitoral) do ser humano ante as agruras da existência: a solidão, a implacável passagem do tempo, a lata de lixo da história pressentida.

Perfaz, ainda, uma denúncia da perda de auto-respeito e da noção de decência que atinge o homem, premido pela certeza da surra eleitoral iminente, digo, do fantasma da morte sempre presente.

Durante décadas, críticos de arte do porte de Arnold Hauser e E. M. Gombrich vêm debatendo o impressionante quadro, perscrutando a origem da horrenda figura que o protagoniza, o sentido do dedo branco sobre sua cabeça, a apontar à direita - e, sobretudo, inquirindo-se sobre a função e a identidade do homenzinho que acena, ao fundo, na ponte.

O expressionismo, mais do que um movimento artístico, torna-se, no decorrer do século seguinte, uma tendência estética recorrente - já foi usado até para o Lobão apelar ao marketing da bandidagem para tentar vender disco. Teve, ainda, um auge cinematográfico, no cinema alemão dos anos 20, com uma profusão de temas como vampirismo, loucura, ditadores crueis. Estes, segundo o crítico Siegfried Kracauer, representariam uma prefiguração de Adolf Hitler e denotariam a ânsia de parcelas da sociedade alemã por um poder tirânico.

Mas isso, felizmente, foi há muito tempo atrás, quando o golpismo envenenava as instituições, açulado por uma mídia venal. Hoje, nada disso ocorre.

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