O boom
dos blogs políticos, no Brasil,
ocorre no bojo da disseminação da web 2.0,
mais veloz e interativa, e das campanhas
eleitorais que reelegeram Luiz Inácio Lula da Silva e levaram Dilma
Rousseff à cadeira presidencial.
É desse ínterim que datam alguns dos principais dos então chamados
"blogs progressistas", denominação que hoje, tomada ao pé
da letra, configura um típico ato falho freudiano, mas que, à
época, procurava indicar a identificação com um ideário político
de esquerda sem circunscrevê-lo explicitamente ao petismo em
ascensão.
Esse
boom de blogs
políticos ocorre, portanto, com um um atraso médio de sete ou oito
anos em relação a fenômeno semelhante – embora de perfil
distinto - nos EUA.
Personalismo
e crise
Um
pouco antes da ascensão da blogosfera progressista já havia, é
fato, uma relativamente forte atividade blogueira em português; mas,
malgrado a existência de alguns ótimos blogs com ênfase em
política – como O biscoito e a massa,
de Idelber Avelar, ou o de Sakamoto -, a impressão era de
alterativas pontuais em um cenário com predomínio de temáticas
humorísticas, de cultura pop, ou mesmo de confusão entre blog e
diário adolescente.
Sobretudo não havia uma articulação conjunta em prol de um ideário
político como, para o bem ou para o mal, ocorreria entre os blogs
ditos progressistas.
Essa ascensão da blogosfera política se dá em um cenário
de agravamento da crise da mídia convencional, seja pela
concorrência com a internet – um fenômeno mundial -, seja pela
perda de credibilidade ante o tendenciosismo ideológico e os
falseamentos dai decorrentes – uma peculiaridade particularmente
grave no Brasil e mais evidente durante a era petista.
Nouvelle
Cuisine
A confluência desses dois fatores – maior oferta de blogs
políticos e crise midiática – fez com que, durante um tempo,
parecesse não apenas possível, mas altamente recomendável, abdicar
do cardápio informativo midiático em prol de uma dieta mais
saudável, cuja base nutricional seria fornecida por uma receita
selecionada de blogs e sites alternativos.
A nova economia informativa exigia algum trabalho de pesquisa,
garimpagem e constante atualização, é verdade, mas a promessa de
acesso a informação desprovida ou menos marcada pelas distorções
decorrentes do conluio entre mídia corporativa e grande capital
faria, alegadamente, valer a pena.
Alternativa
à mídia
Essa lógica prosperou durante um tempo, e foi com um misto de alívio
e alegria que muitos constaram, por exemplo, que abdicar da leitura
diária daquele jornal que considera a ditadura branda resultava não
apenas em economia de alguns caraminguás, mas no benefício de
trocar os repetitivos ardis da coluna da Cantanhêde pela novidade
reluzente do texto de um blogueiro cuja opinião não se media pela
régua do patrão.
Embora tal tendência pareça irrefreável, persevere e apresente
avanços qualitativos em boa parte do mundo, essa lógica da
substituição da mídia corporativa pela produção dita
independente como principal fonte de informação ora claudica, na
seara política, no Brasil. E pelos motivos que se seguem, coadunados
entre si.
PIG do
B
O primeiro, e mais grave, é que adotar como principal fonte de
informação, hoje em dia, os blogs progressistas equivale a receber
uma informação tão ou mais distorcida do que a oferecida pela
mídia corporativa, só que com sentido político-ideológico
invariavelmente pró-petista.
Isso de dá devido à constatação de que fica cada vez mais
evidente que tais "progressistas", em sua maioria, não
hesitam em se valer dos mesmos truques retóricos, estratégias
desqualificadoras, flacidez ética e miopia ideológica que tanto
criticam na mídia corporativa – a qual chamam de PIG.
Transformam, desse modo, o debate político num autêntico vale-tudo
para defender as forças no poder, as quais reputam como de esquerda,
a despeito das privatizações a granel, da manutenção do tripé
econômico neoliberal, da repressão a greves e manifestações
populares e de tantos traços identificadores da pior direita.
Formam, assim, o PIG do B, na definição sarcástica da jornalista
Denise Queiroz.
Pois os blogueiros progressistas, assumidos ou não como tais,
abdicaram, há tempos, da análise política equilibrada, ponderada e
baseada em fatos, substituída por uma lógica antimidiática e
partidária de caráter meramente reativo, cujo objetivo precípuo é
justificar toda e qualquer medida dos governos petistas.
Exposição
na mídia
O segundo aspecto problemático da atual conformação da blogosfera
política no Brasil é a própria visibilidade hegemônica da qual
desfrutam os blogs progressistas, assegurada pela grande projeção
midiática de alguns de seus principais blogueiros, graças à
exposição (prévia ou mesmo atual) nas redes televisivas ou nas
redações que tanto criticam (Paulo Henrique Amorim, Nassif, Azenha,
Paulo Nogueira, Rodrigo Vianna), do maior acesso a verbas de patrocínio –
em sua maioria estatais - e do fato de, não obstante conservarem
alguma independência entre si, atuarem estrategicamente como um
grupo uno.
Pois um dos principais traços distintivos dos blogueiros
progressistas é que agem em conluio: há uma espécie de hierarquia
entre eles, sendo que um repercute os posts dos outros e os
articulistas cujas opiniões destoam das da manada ou que constam do
índex de um não são publicados por nenhum dos outros.
Debate cerceado
Essa
ação quadrilheira de tonalidades obscurantistas reduz drasticamente
a visibilidade de blogs não afinados com a linha política
predominante entre os progressistas – ou seja, a fé religiosa e
intransigente no petismo. Comprova, ainda, que são relativas as
contribuições dos progressistas para a diversidade midiática,
notadamente no que se refere a temas políticos, limitados que estão
não somente em publicizar o que seja de interesse chapa-branca, mas
também em bloquear a difusão das críticas, mesmo se à esquerda.
Assim agindo, a blogosfera progressista emula o modus operandi do
próprio petismo no poder, e com resultados semelhantes: pois, tal
como o governo que apoia, traveste-se de esquerda e ocupa
indevidamente o locus político que a esta de direito
pertenceria, esvaziando-o. E o faz corroborando a adoção de um
receituário que, com a única exceção das políticas de renda
mínima, mostra-se intrinsecamente conservador, entre outros
aspectos, nos terrenos da economia, da biopolítica, dos Direitos
Humanos e do arcaico modelo desenvolvimentista adotado.
A
blogosfera progressista é, hoje, uma força do atraso.
2 comentários:
Concordo totalmente com sua analise do espectro politico dos blogs progressistas e seu contraponto direto a midia tradicional. Por outro lado, vc tem alguma alternativa de açao para contrabalancear o poder midiatico das grandes corporaçoes? Vc criticou o aspecto sectario dos blogs, mas do outro lado vc ve equilibrio? Claro que é importante debater serenamente os temas nacionais, mas e qdo existe um completo aggiornamento à direita das pautas das redaçoes? Jornais e revistas que publicam sempre as mesmas coisas, diuturnamente contra o governo e o PT? Ou vc prefere que o governo e a populaçao assistam calados ao bombardeio diario de má informaçao, que os blogs progressistas tentam rebater? A diferença basica entre a midia tradicional e os blogs é a verba publica que escorre pelas veias abertas do poder pra irrigar redaçoes onde impera a mais abjeta forma de jornalismo, o jornalismo das ilaçoes, ou, em tempos de MP, em "denuncia informal". Tem alguma soluçao pra contornar as mentiras publicadas pela Veja,Epoca, Folha, Globo, Estadao, RBS? Cade a etica jornalistica que um dia serviu de base pro exercicio da profissao? Ou esta so pode ser aplicada no caso dos blogueiros dito progressitas?
Rick,
Parece-me evidente a necessidade de democratizar a comunicação no Brasil, coibindo a propriedade cruzada e promovendo a pluralidade.
Não é, no entanto, o que se vê atualmente. Por um lado, o PT no poder não ousou regulamentar minimamente a mídia (pelo contrário, continua a sustentar as principais corporaçoes, via Secom).
Por outro, como tento abordar no texto, os blogs ditos progressistas estão cada vez mais presos de um sectarismo partidário.
Penso ser evidente a necessidade de pluralidade, mas que supere a (falsa) oposição mídia corporativa x PT. Nem os progressistas nem o governo que apoiam têm contribuído realmente para isso.
Obrigado pelo comentário.
Postar um comentário