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domingo, 17 de julho de 2016

O legado petista nas Comunicações

A questão da comunicação não só permanece como um grave problema a afetar a democracia brasileira, como, ao final de um período de 13 anos em que a dita esquerda esteve no poder, intensificou-se ainda mais. Tanto o advento da TV digital quanto a difusão do acesso à internet tiveram, em relação a democratização e melhoria da qualidade do debate político, efeitos muito menores, pontuais e contraditórios do que os esperados. Tal façanha se deve, em grande parte, ao misto de inação e ação partidarizada nas políticas comunicacionais dos governos Lula e Dilma.


Legado da ditadura agravado durante a redemocratização, os problemas estruturais da mídia, identificados e corroborados por estudos diversos, acadêmicos ou não, permanecem, na essência, os mesmos do início do milênio: concentração das concessões televisivas em um punhado de plutocracias familiares, concessões radiofônicas utilizadas como moeda de troca política, mecanismos ineficazes para coibir o jornalismo difamatório e fazer valer, em tempo hábil, o direito de resposta; ausência de planejamento e de políticas efetivas de democratização da comunicação em curto, médio e longo prazos.







Conluio com as teles
A "novidade" mais notável é a extensão de tal perfil concentrador e antirrepublicano ao universo da telefonia celular e da internet, em que dois ou três conglomerados empresariais - as chamadas teles - monopolizam o mercado. Em conluio com interesses empresariais e eleitorais - e em comum acordo com o governo de turno - patrocinaram o fracasso do Plano Nacional de Banda Larga, que, anunciado na primeira eleição de Dilma Rousseff como meio de massificação do acesso à internet no país, revelou-se (mais) um golpe eleitoral.


No bojo de tal processo, as teles solidificaram-se como as principais doadoras eleitorais, agravando o jogo de interesses por trás do "faz-de-conta" das agências reguladoras, herança dos anos tucanos mantida incólume pelo petismo. Assegurou-se, assim, a prática de preços extorsivos em troca de um serviço muito abaixo dos padrões internacionais, um dos mais altos índices de exclusão digital entre países em desenvolvimento, e - em flagrante afronta aos direitos do consumidor - a corrente ameaça de impor limites ao uso da internet, com cobranças extras e até bloqueio do sinal.






Militância e jornalismo

Se, no que tange ao seu funcionamento estrutural, as mídias digitais apresentam problemas de tal gravidade, a situação, em termos de políticas de conteúdo, não é menos pior. Em vez de criar meios e mecanismos de incentivo à produção jornalístico-midiática diversificada e crítica, preferiu-se injetar recursos públicos em blogs e sites de exacerbada (embora quase nunca assumida) militância em prol de certas forças políticas. Como resultado, instaurou-se não só a confusão entre militância partidária e jornalismo, mas entre defesa de um governo capitaneado por uma aliança entre PT, PMDB e PSD com esquerdismo - o que teve como agravante um movimento de reação na forma de proliferação de sites e blogs situados na extrema-direita do espectro político-ideológico.


No bojo de tal processo, a própria crítica de mídia, que desempenhou um papel desmistificador e de alta relevância republicana nos primeiros, digamos, 15 anos dede o início da operação comercial da internet no país, expondo pela primeira vez, de forma crua e clara, o tendenciosismo e as ligações políticas e corporativas dos meios de comunicação, acabou por degenerar numa vicissitude, uma prática diária de agitprop maníaca e maniqueísta. Pois denúncias ou críticas contra as forças políticas defendidas pelo agentes virtuais ditos progressistas são tratadas, INVARIÁVEL E AUTOMATICAMENTE, como comprometidas ou "golpistas". Tal processo, ao recusar, a priori, o confronto analítico com qualquer critica, fato ou problema - inclusive os reais -, acaba por corresponder ao fornecimento de salvos-condutos incondicionais e eternos às forças políticas de devoção de tais agentes, eternizando bodes expiatórios os quais dificultam ou mesmo impedem que aquelas pratiquem a necessária autocrítica e a eventual correção de rumos.



Descritério e dissimulação


Para completar, tais agentes virtuais, levando a hipocrisia ao paroxismo, não se furtam a divulgar amplamente as notícias e análises produzidas pelos mesmos meios ditos não confiáveis ou "golpistas" quando estas são favoráveis às forças políticas que defendem. Dois pesos, duas medidas.

Como seria de se esperar, em um ambiente comunicacional contaminado por tal grau de maniqueísmo, a relação entre a mídia corporativa e o governo é analisada quase que exclusivamente como oposição e enfrentamento. Tal perspectiva, marcada pelo vitimismo, despreza nuances e negligencia ou finge não se dar conta das muitas ocasiões e tópicos em que as ações governamentais foram corroboradas ou mesmo defendidas pela mídia -  caso da tunga, digo, reforma da Previdência dos servidores públicos no governo Lula, das privatizações (" concessões", em novilíngua petista), do leilão do Pré-Sal, da escolha  de Joaquim Levy para comandar a economia no segundo governo Dilma, da repressão aos protestos de junho de 2013 e da Copa pela Força Nacional, entre tantos outros.






Linhas auxiliares

Enquanto era uma alvissareira novidade às manipulações do conluio mídia-mercado, tal atividade de militância travestida de jornalismo conseguiu, ante um público considerável, passar-se por avanço. Mas hoje, quando o caráter de linha auxiliar do petismo é evidente - e corroborado tanto pela divulgação das provas de destinação de vultosas verbas públicas quanto pelo anúncio de candidaturas eleitorais de blogueiros ditos progressistas - tornou-se, sobretudo, um canal para doutrinação de convertidos, agravando ainda mais o efeito-bolha propiciado pelas redes sociais.


Uma das consequências mais nocivas de tal processo é que, em um efeito-cascata generalizante, não só o próprio termo "blogosfera" como, em larga medida, a atividade jornalística alternativa na internet foi estigmatizada como partidarizada e militante, portanto, pouco ou nada confiável como informação e análise - não raras vezes (como cada vez mais pessoas se apercebem) tanto ou mais do que aquelas produzidas pelo establishment jornalístico. Entre a mídia-mercado e a mídia-partido, um vácuo.







Atraso e descompasso

Não só se perdeu, assim, uma janela de oportunidade histórica de criação de nichos jornalísticos alternativos sólidos, críticos e plurais, fora do tacão dos conglomerados midiáticos ou das forças partidárias; mas, como reação ao engodo de se traficar militância sob o rótulo de jornalismo, estigmatizou-se, de forma genérica, a possibilidade de que tal avanço - comum, hoje, à arena pública da maioria dos países democráticos - venha a acontecer no curto ou médio prazos. 


Ou seja, em termos de políticas de comunicação, o legado de mais de uma década da dita esquerda no poder inclui não apenas a manutenção, regiamente alimentada por generosas verbas públicas, do poder desproporcional de uma corporação midiática erigida em torno de um canal de TV, mas um modelo concentrador e abusivo de mídias digitais, além da preferência por patrocinar - até na TV pública, um avanço democratizante, se se guiasse por princípio republicanos - a ação de militantes protopartidários em detrimento do estímulo à diversificação e à crítica em moldes apartidários. Um retrocesso imensurável, pelo qual o país seguirá pagando um alto preço. 



(Imagem retirada daqui)

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