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"Se você não votar em Dilma, vai votar em quem?" - A
pergunta, em tom passivo agressivo, costuma ser dirigido a quem quer
que, sem identificar-se com o conservadorismo, dê mostras de estar
desiludido com o atual governo e com o estágio de setores essenciais
como Educação, Saúde, Meio Ambiente e Transportes após mais de
uma década de administração petista.
Vem,
de ordinário, acompanhada de duas listas: uma contrapõe os números
da economia e de indicadores sociais ao final do governo FHC e após
uma década de petismo; a outra desqualifica minuciosamente os
prováveis opositores a Dilma nas eleições do ano que vem,
culminando com o realçar de qualidades da atual mandatária, das
óbvias às inauditas, passando pelas menos evidentes.
Distorções
metodológicas
Como
a primeira lista exaustivamente demonstra, não restam
dúvidas de que, em termos de economia – e, sobretudo, de
conquistas sociais por esta proporcionada – os petistas batem de
goleada os tucanos. Isso, no entanto, não impede a constatação de
algumas distorções relativas à lista.
As
duas primeiras são de cunho histórico e metodológico: comparar os
oito anos dos tucanos com os 10 anos e meio dos petistas denota
descritério, posto que o tempo disponível aos primeiros para
consolidar melhorias seria, dessa forma, cerca de 30% do que o
disponível aos últimos. A comparação justa e cabível no caso
seria entre a presidência de FHC e a de Lula, ambas de dois mandatos
de igual duração. Neste caso, igualmente, a supremacia desta ante
aquela em virtualmente todos os quesitos de economia social mostra-se
pronunciada.
Deriva
diretamente de tal descritério a segunda e mais grave distorção
inerente às listas petistas de convencimento: ao comparar o legado
de FHC com o de Lula e Dilma indistintamente e em bloco, impede-se
que o eleitor tenha uma correta dimensão das falhas e acertos do
governo da atual mandatária. Pois, com o perdão pela obviedade, o
antecessor imediato desta não é o sociólogo de triste memória,
mas, para o bem ou para o mal, Lula, o arquiteto do "novo
Brasil" que aí está. Desnecessário assinalar que se trata de
uma omissão deliberada, pois não só a candidata petista tende a
sair muito mal na foto na contraposição a seu mentor e sucessor
imediato, mas tal comparação daria ao público em geral, de forma
didática, a dimensão de sua problemática administração e a
explicação das razões de fundo para as manifestações populares
deflagradas a partir de junho.
Meras
desqualificações
Quanto
à segunda lista que é volta e meia apresentada aos eleitores
desencantados, novos ou antigos, ela prima pela desqualificação dos
opositores ao petismo. Trata-se de uma arte que o PT sempre cultivou,
mas que atingiu novos patamares com a assimilação, nos últimos
anos, dos métodos do jornalismo neocon de
Veja e similares, os
quais implicam na ausência de limites ou bom senso e na concepção
do opositor - e dos críticos do partido, mesmo se eventuais - como
inimigo.
Independentemente
de quem sejam os concorrentes, trata-se de um método abjeto. Se esta
avaliação talvez pareça menos evidente quando o opositor em
questão é, digamos, um Aécio Neves, advindo de um partido com um
histórico de enfrentamento feroz com o petismo - incluindo vários
golpes baixos -, ela mostra-se rigorosamente justa quando se observa
o tratamento ora dispensado pelo partido e seus militantes a figuras
que até ontem eram, na condição de aliados ou mesmo estrelas
petistas, pelos próprios exaltadas, como, respectivamente, o
governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB/PE) ou Marina Silva (sem
partido), ex-senadora do Acre pelo próprio PT.
De
exemplar à execrada
O
caso da acriana é particularmente exemplar como evidência da
memória curta, da volubilidade de critérios e da lógica "quem
não está conosco está contra nós" do petismo em sua fase
ultrapragmática. Quadro formador do petismo e por este formado,
Marina foi durante décadas saudada como uma personalidade política
especial dentro do partido: expoente amazônico e seu maior expert
em políticas ambientais,
compôs, durante décadas, uma espécie de arquétipo feminino de
Lula, na origem humilde, na ascensão intra partidária a partir das
bases, no reconhecimento internacional.
Esse era o status de Marina Silva
até 2008, quando, após cinco anos de uma atuação sem precedentes,
saudada e premiada nacional e internacionalmente, como ministra do
Meio-Ambiente do governo Lula, pede demissão ao final de uma série
de conflitos com a chefe da Casa Civil e gerentona do progressismo a
qualquer custo, a hoje presidente Dilma Rousseff.
Do dia para a noite, a proeminente aliada
vira persona non grata nas hostes petistas, despertando a fúria
por ter ousado primeiro enfrentar, depois rejeitar um projeto
político baseado na relativização da ética para alianças
partidárias e em um modelo arcaico de desenvolvimentismo na área
econômica. Com o lançamento de sua candidatura à Presidência em
2010, pelo PV, consuma sua transformação, aos olhos petistas, em um
ser pestilento, repositório de tudo que há de repulsivo e
condenável na política nacional.
- "Ela é crente!" - brada o
petista típico, listas nas mãos, como se se referisse a um
assassino de bebês, como se professar uma religião fosse
impedimento ao exercício da Presidência, como se o próprio governo
Dilma não fosse o playgound do neopentecostalismo,
determinando vetos presidenciais contra kits educativos, patrocinando
um vergonhoso atraso nas questões relativas a comportamento e a
gêneros sexuais, zombando da cidadania e dos Direitos Humanos ao
deixar, por desinteresse, um representante do atraso como Marco
Feliciano presidir a comissão legislativa relativa ao tema.
Jovens
eleitores x anacronismos
Em
pleno 2013, a quem os petistas pensam que enganam com tais
estratégias discursivas, com tais discrepâncias entre discurso e
prática, com uma concepção de política em que o gozo da ética e
da legitimidade pertence exclusivamente aos membros do partido, e os
que a eles se opõem, na opinião pública ou na arena eleitoral, são
concebidos como inimigos aos quais se destina a desqualificação e o
extermínio?
Os
protestos nas ruas, a despeito de sua virulência e espontaneidade,
não parecem estar servindo de alerta – e isso se dá em grande
parte graças à mitomania do partido, viciada em livrar-se das
críticas atribuindo-as exclusivamente à má vontade da mídia, e
que tem sido internamente bem-sucedida em atribuir as manifestações
a novos bodes expiatórios, como o Facebook e até misteriosos
organismos internacionais. Mas o fato inconteste é que, nas próximas
eleições, jovens entre 18 e 25 anos devem vir a ter um papel
decisivo. Para eles, que tinham entre 6 e 13 anos quando FHC
transferiu o poder a Lula e passaram toda a vida sob o o governo do
PT, as listas de convencimento petistas, com suas comparações
maravilhosas, tendem a ser não apenas anacrônicas, mas
contraproducentes: anseiam pelo novo, mas lhes é oferecido uma
mirada no retrovisor, focada em um passado que sequer viveram.
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"Não votar em Dilma é votar na direita" – conclui o
petista típico, em uma oração que resume de forma cabal a pobreza
binária de seu raciocínio, a (por si questionável) arrogância
exclusivista na qual se baseia e a escassez de alternativas as quais
sua visão autocentrada deixa de enxergar.
(Imagem retirada daqui e manipulada digitalmente)