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quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

A farsa petista na Comissão de Direitos Humanos

A possibilidade de um petista ser eleito para a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados foi, em um primeiro momento, saudada nas redes sociais, até mesmo pela oposição à esquerda. Isso se deu pela nomeação supostamente significar a retomada da comissão para o campo progressista, após um mandato sob o comando do pastor Marco Feliciano (PSC/SP), que fez dela palco para o proselitismo religioso, o ataque contra gays e minorias e o retrocesso na pauta dos Direitos Humanos.

No entanto, o alívio pela eleição de Assis do Couto (PT/PR) logo cedeu lugar a frustração e raiva, à medida que se evidenciava o perfil do deputado: um especialista em agricultura familiar, conservador, contrário ao aborto e sem conhecimento ou experiência mínima no campo dos Direitos Humanos.



Baixa política
Sua nomeação é fruto direto do desleixo e do descaso petista para com os DHs: Couto já estava assegurado para a presidência da Comissão de Agricultura, a preferida do PT, disposto a abrir mão, uma vez mais, da Comissão de Direitos Humanos. Porém a forte reação contrária nas redes sociais e entre setores da militância, inconformados ante a possibilidade de que os DHs permanecessem mais um mandato nas mãos do conservadorismo religioso, obrigou o partido a recuar.

Esse recuo, no entanto, foi meramente cosmético. Sem renegociar, sem sequer empenhar-se em nomear um quadro com histórico de lutas pelos DHs - os nomes mais cotados eram os de Nilmário Miranda (MG) e Erika Kokay (DF) –, o PT, uma vez mais, privilegiou a pequena política e seus obscuros acordos paroquiais, em detrimento de uma ação republicana, consistente e socialmente responsável.



Prêmio de consolação
Ao encarar a presidência da CDHM como um "prêmio de consolação", uma troca desvantajosa imposta pela forte reação contrária, o partido deu vazão a um comportamento que sequer dissimula sua má vontade e seu caráter pirracento, pouco consequente.

Em decorrência, ao optar por preterir quadros reconhecidamente capazes no campo dos DHs e nomear um agricultor familiar, inexperiente no tema e ligado à "Frente Mista Em Defesa da Vida – Contra o Aborto" (que reúne evangélicos e católicos, como ele), o partido se omite e, uma vez mais, deixa explícita a pouca importância que atribui aos Direitos Humanos.



Os DHs sob ataque
Tal omissão é particularmente grave neste momento histórico do país, em que os índios são vítimas de um novo genocídio, em nome de um modelo arcaico de desenvolvimento e sob o silêncio cúmplice da mídia.

Em que gays são rotineiramente agredidos e assassinados, seja no Baixo Augusta ou nos arrabaldes de cidadezinhas perdidas no tempo.

Em que, a despeito do esforço civilizante e da Lei Maria da Penha, a violência contra as mulheres se mantém em níveis endêmicos.

Em que cresce impunemente a ação de linchadores contra pequenos delinquentes, amarrados a postes como figuras de Debret, numa reatualização muito além de iconográfica do legado da escravidão.

Em que à violência policial como repressão periférica soma-se – e se torna rotineira - a brutalidade da PM contra os que exercem o direito constitucional à manifestação pública.



Truculência recorrente
Não que chegue a causar estranhamento essa postura do petismo. A falta de dialogo com o sindicalismo, com as organizações públicas e com a sociedade em geral é um traço distintivo desses três anos e pouco de governo Dilma. Renato Janine Ribeiro relata a estupefação de um grupo de grandes empresários com o imperscrutável comportamento presidencial: -"Ela não ouve. Nem fala".

Ainda mais explícitos em seus intentos autoritários são o endosso do governo a uma legislação draconiana de combate ao terrorismo – AI-13? -, supérflua ante o Código Penal e desautorizada por juristas de gabarito e democratas de juízo; a aposta de Cardozo na repressão e a facilidade com que oferece a Força Nacional para reprimir os "vândalos baderneiros"; e, entre outras tantas manifestações de truculência antidemocrática, o entusiasmo de Fernando Haddad ante a "Tropa Ninja" da PM paulista, que ajudou a brutalizar as últimas e até então pacíficas manifestações em São Paulo.

E sendo que tudo se dá num contexto no qual o Ministério dos Direitos Humanos, sob a complacente Maria do Rosário, mantém os olhos cerrados para toda a violência oficial, fingindo ser um órgão destinado tão somente a defender cidadãos fardados.


Pingos nos is
A eleição de Assis do Couto insere-se, portanto, em um contexto maior, a partir do qual sua intencionalidade se explica (mas não se justifica). Ela vem fornecer mais um exemplo cabal do quanto o PT negligencia os Direitos Humanos.

Tornou-se corrente, entre as hostes governistas, atribuir tal percepção negativa ora à má vontade da mídia, ora a uma alegada falha de comunicação do próprio governo. Mas claramente não é este o caso no que concerne à atuação do partido no episódio, fruto de uma política deliberada, um cala-boca improvisado e desdenhoso contra a gritaria dos que ousaram protestar.

Tudo somado, a nomeação, pelo PT, de Assis Couto para a CDHM deve ser entendida como o que é: um acinte e um deboche.


(Cartum de Latuff retirado daqui)

Um comentário:

Itárcio Ferreira disse...

Triste PT.

Lula foi inocente ao negligenciar as nomeações para a PGR e para o STF ou agiu de forma intencional?

A indicação de Dilma foi um desastre anunciado ou tática de subserviência ao capital?

Infelizmente, Maurício, seu texto expõe a nu a verdadeira face trabalhista, aliada do capital e mais nada.

Abraços!