A
publicação, nas redes sociais, de uma foto dos protestos populares
adulterada digitalmente, com a suástica nazista substituindo o que
na imagem original era uma bandeira negra sem estampa, é, ate agora, a
mais grave – mas de forma alguma a única – das evidências de
que a campanha pré-eleitoral deste ano será muito suja, e de que o
mal chamado "campo progressista", a despeito de sua postura
de eterna vítima da mídia, não terá escrúpulos para valer-se de
métodos por esta consagrados e promover a lambança.
O
divulgador da foto – um dos principais "blogueiros
progressistas" – alega ter copiado a imagem de uma campanha no
Facebook (como se isso o isentasse de verificar sua autenticidade),
mas, no mesmo dia, divulgou um registro fotográfico dos protestos dos camelôs
cariocas como se das manifestações de ontem em São Paulo se
tratasse - nos dois casos, com o objetivo de criminalizar o movimento
popular paulista. Para piorar, tais armações, mesmo depois de
desmascaradas, continuam sendo divulgadas à exaustão nas redes
sociais, num processo que depõe contra a ética e a própria
democracia, e que tem a clara intenção de desqualificar
manifestações populares em prol da repressão oficial.
Da
genealogia do esgoto
Ao
menos desde os anos 90 foi se formando uma espécie de consenso, em
setores do centro à esquerda do arco político, de que a mídia
corporativa e os partidos com os quais ela se identifica seriam os
responsáveis pelo baixo nível das campanhas eleitorais. A própria
constituição da chamada blogosfera progressista e da atividade
política individual na internet se deu, em ampla medida, como reação
a tal estado de coisas, que chegou ao paroxismo nas eleições
disputadas por José Serra, frequentemente acusado de se valer de
dossiês e textos apócrifos. Caberá à história rever
criteriosamente tais eventos e avaliar responsabilidades.
Mas
em 2014 o fato é que José Serra não está mais em campanha e já
temos ao menos um texto apócrifo (contra Eduardo Campos e Marina
Silva) muito divulgado a partir de site oficial do PT e mentiras e
armações como as citadas sendo repetidas à exaustão nas redes
sociais – só que agora, em ambos os casos, o beneficiário de tais
métodos inaceitáveis em uma democracia é o petismo no poder.
Agrava a situação a inexistência de informações oficiais que permitam distinguir entre os blogueiros e ativistas digitais que exercem sua atividade por identificação com a causa e os que o fazem como compromisso profissional. Tal comportamento só faz alimentar os rumores – neste momento, intensos - sobre quem estaria na folha de pagamentos petista, lançando ainda mais suspeições sobre a blogosfera "progressista" e seus satélites nas redes sociais. Como apontou com propriedade o professor e ex-blogueiro Idelber Avelar, seria mais ético e proveitoso para todos que os remunerados assumissem publicamente sua condição.
Agrava a situação a inexistência de informações oficiais que permitam distinguir entre os blogueiros e ativistas digitais que exercem sua atividade por identificação com a causa e os que o fazem como compromisso profissional. Tal comportamento só faz alimentar os rumores – neste momento, intensos - sobre quem estaria na folha de pagamentos petista, lançando ainda mais suspeições sobre a blogosfera "progressista" e seus satélites nas redes sociais. Como apontou com propriedade o professor e ex-blogueiro Idelber Avelar, seria mais ético e proveitoso para todos que os remunerados assumissem publicamente sua condição.
Chama
a atenção, no caso, o quanto um movimento político da internet que
teve na crítica e no combate aos desmandos da mídia corporativa a
sua razão de existência mostra-se disposto, cada vez mais, a
mimetizar, por um lado, as transgressões éticas, estratégias
desqualificadoras e baixa fidelidade aos fatos que caracterizam a
atividade midiática no país e, por outro, os truques empregatícios
historicamente associados à pior direita. Em relação aos primeiros
quesitos, isso inclui desde a tática, muito usada por blogueiros com
grande audiência, de postar um ou dois textos medianamente críticos
ao governo em meio a uma enxurrada de artigos chapa-branca (algo que,
em sentido inverso, a Folha de S. Paulo sempre foi acusada de
fazer), passa pelo uso generalizado aos ataques pessoais agressivos
(a marca registrada do jornalismo neocon de Veja) e
chega à desfaçatez com que evidências são fabricadas (como não
notar, no citado caso das fotos adulteradas, as semelhanças com a
publicação, pela Folha, da ficha policial falsa de Dilma?
Até as desculpas dadas em um e no outro caso se parecem).
À
semelhança da mídia
Essas
mudanças no modus operandi de blogs e perfis governistas
fazem com que, na internet, o debate sobre as questões
político-sociais mais urgentes ceda cada vez mais lugar a ataques
desqualificadores contra os críticos do governo, os manifestantes
nas ruas, os candidatos oposicionistas de 2014 (alguns dos quais eram
ícones ou aliados do petismo até anteontem) e, de forma intensa, a
Joaquim Barbosa, que desde o processo do "mensalão" passou
a dividir com a mídia corporativa o papel de principal alvo do ódio
chapa-branca.
Nas
críticas a Barbosa, não raro com tinturas de racismo, merece destaque a constatação de que mal
disfarçam as motivações revanchistas e partidárias e
concentram-se quase sempre em picuinhas e denúncias artificialmente
infladas, que raramente se inserem em uma crítica sistêmica aos
problemas estruturais da Justiça brasileira – mesmo porque isso
demandaria, necessariamente, examinar a relação do governo que há
mais de 11 anos comanda o país com o Judiciário (da qual, convém não
esquecer, decorre a própria nomeação ao STF de Barbosa - e de
outros sete juízes que atuaram no julgamento do "mensalão").
Convém
frisar que não se trata, aqui neste texto, de defender a mídia ou
Barbosa. Muito pelo contrário: o ministro do STF já deu varias
demonstrações públicas de que seu comportamento irascível,
pontuado de grosserias contra repórteres, destoa do que se espera de
um homem público em sua posição num regime democrático. E a mídia
corporativa, dada sua extrema concentração como oligopólio e o
fato estar aliada, na raiz, aos interesses do grande capital,
prossegue como um dos mais graves obstáculos para a conquista da
democracia plena no país – para o que, na contramão do discurso
histórico do PT, muito tem contribuído não só a recusa do governo
Dilma em debater um projeto de democratização das comunicações,
mas as vultosas verbas que a SECOM pontualmente repassa a empresas em
situação pré-falimentar, nos âmbitos econômico e ético.
Trata-se, isso sim, de apontar contradições essenciais e parâmetros
axiológicos viciados que distorcem e tornam tendenciosas, a favor
das forças ora no poder, as análises produzidas pelos
"progressistas".
Medos
e urgências
Parece
razoável supor que, para além da questão da militância virtual
remunerada, parte dessas distorções explique-se por paixões
partidárias, identificação com o governo Dilma, tensão
pré-eleitoral, atmosfera de turba e mesmo a existência de uma linha
editorial invisível mas efetiva a permear, por osmose ou
identificação de grupo, as análises advindas dos chamados "blogs
progressivos".
Porém
minha opinião é que o acirramento de tal comportamento nos últimos
meses se deve, em ampla medida, aos esforços para renegar e sublimar
as evidências, cada vez mais claras, de que há graves e reais
ameaças à continuidade do projeto de poder da aliança governista
e que o "paraíso petista" forjado justamente por tais
blogueiros não passa de uma quimera. Pois ações temerárias -
como as adulterações de imagens levadas a cabo neste final de semana - indicam desespero, e desespero denota
medo. E as manifestações nas ruas são tão temidas pelos
governistas não apenas por sua imprevisibilidade ou por um seu
caráter alegadamente "golpista", mas por se constituírem
no sintoma que denuncia o grau de enfermidade do país e a urgência
das mudanças.
2 comentários:
Como sempre arrebentando, deveria ter conhecido esse seu blog a alguns tempos atrás. Assim, teria sabido quem realmente é o #Umbiguim e sua bloguesfera peleguista.
Antes tarde do que nunca, Eduardo!
Obrigado pelo comentário, abraço.
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