Se
confirmada, será um acinte a anunciada decisão de Eduardo Cunha
(PMDB/RJ) de começar a votação pelos deputados do Sul, como forma
de "criar um clima pelo impeachment" e pressionar parlamentares do Nordeste (alegadamente mais propensos a votar em Dilma).
Mesmo
na sessão do impeachment de Collor, em 1992, que contava com uma
quase-unanimidade a favor (a qual não se verifica no processo
atual), a votação foi em ordem alfabética, justamente para evitar
acusações de favoritismo ou distorções no processo.
Não
tenho dúvidas de que quanto mais evidentes as manipulações de
Cunha, mais alimentarão o discurso do "golpe" e o
ressentimento de parcelas dos eleitores, o que pode resultar tanto em
irrupções de violência pública no curto prazo quanto, para 2018,
num refortalecimento do lulismo.
É
verdadeiro o argumento de que Cunha foi cobra criada pela aliança
entre PT e PMDB no Rio, só tendo sido alçado à posição de poder
que ocupa graças ao misto de irrealismo, incapacidade de articulação
política e megalomania delirante de Mercadante e Dilma, cuja decisão
desastrada de "desidratar o PMDB", principal partido da
aliança, está na gênese da crise. Constatar tal retrospecto, no
entanto, não me parece minimamente suficiente para justificar que
sejamos complacentes com as tramoias de um político que age com
total desfaçatez e à revelia da ética. A menos que o ódio ao
petismo se sobreponha ao apego pelos ritos básicos da democracia.
Com
todo respeito aos que pensam de outra forma, alegar que o petismo, no
poder, tampouco tem respeito pela democracia, não obstante tratar-se
de uma verdade cristalina - como se vê nas sucessivas violações
aos direitos trabalhistas e previdenciários, no uso da Força
Nacional para reprimir manifestantes pacíficos, no genocídio
indígena, nos inúmeros casos de corrupção -, não me parece um
argumento convincente de que, então, as violações democráticas
contra o PT tenham de ser toleradas.
Pois
tal retrospecto não significa, automaticamente, a concessão de um
salvo conduto para que os críticos do petismo nos calemos ante as
flagrantes violações diretas ou indiretamente ligadas ao processo
de impeachment em curso - pelo contrário: a coerência, para mim,
consiste em condenar todas e quaisquer violações ao Estado de
Direito, mesmo quando elas se voltam contra aqueles aos quais
póliticamente nos opomos. A mesma indignação contra as violações
de direitos que fez com que me opusesse e as denunciasse, na era
Dilma, faz com que as denuncie agora, ainda que contra aquela que
julgo a pior presidente do período pós-ditadura.
O
contrário disso me parece a adoção de um duplo padrão ético -
ou, em outras palavras, a adesão a uma lógica de moral cínica.
(Imagem retirada daqui)
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