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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Um belo livro

Ontem o correio trouxe um livro que eu vinha “paquerando” há algum tempo. Ele chegou de surpresa – pois o site não havia confirmado a compra -, o que intensificou o efeito que provocou: assim que o tive nas mãos, fiquei admirando sua capa, seu inebriante aroma de livro virgem, enquanto folheava-lhe as páginas, travando um primeiro contato com conhecimentos expressados de uma maneira inédita para mim.

Essa singela experiência corroborou minha impressão de que, mesmo quando vier a aderir aos e-readers – o que deve acontecer em breve, tão logo questões essenciais como um preço mais justo e aceitação fácil de todos os formatos de arquivo sejam resolvidas - não pretendo abrir mão da experiência tátil/olfativa de manusear com deleite um livro.

Lançado há três meses, o Dicionário Crítico do Feminismo vem preencher uma lacuna – eu diria uma cratera – na literatura disponível em português sobre o tema – o qual abarca, a um tempo, um rico campo de estudos e um dos mais significativos, perenes e influentes movimentos sociais modernos.

Os 48 verbetes da obra discutem, de forma didática mas profunda, um amplo leque de temas, recorrentes não apenas na teoria mas na prática feminista, notadamente aqueles que perfazem uma ligação entre a condição feminina e circuitos sociais como educação, trabalho e sexualidade. Tanto para quem estiver travando um primeiro contato com tal universo como para os já iniciados, trata-se de um livro essencial

Senti falta apenas de um ou dois verbetes que dessem conta da relação entre arte e feminismo e deste com o cinema – confluência responsável por obras notáveis - como as das diretoras Germaine Dulac, Chantal Ackerman e Margarethe von Trotta – e por influentes desenvolvimento teóricos – acima de tudo, o seminal artigo de Laura Mulvey, “Visual pleasure and narrative cinema” (1975), que transcendeu as fronteiras dos Estudos de Cinema e tornou-se referencial para outros campos do saber.

As autoras dos verbetes, em sua grande maioria, são francesas – mas entre elas, há duas brasileiras: Maria José F. Rosado Nunes, professora da Universidade Metodista de São Paulo, e a economista e pesquisadora Vivian Aranha Saboia. Cerca de 90% delas são sociólogas, característica que, somada aos textos que produzem – claros, sem uso de jargões e de conceitos restritos aos iniciados e, em sua maioria, informados por referências histórico-sociais à maneira do filologismo alemão - as distingue de suas colegas norte-americanas, cujo encastelamento de décadas nos departamentos de Women's Studies tantos danos têm causado à própria causa que alegam defender – notadamente aqueles referentes a sua institucionalização acadêmico-social, ao hermetismo deliberado e elitista, e à perpetuação de feudos que, embora muito beneficiem seus integrantes, pouco ou nada produzem de efetivo em relação à causa feminina - uma realidade a qual Camille Paglia debateu com primor e veemência.

Para completar, o livro, organizado por um corpo de pesquisadoras lideradas por Helena Hirata - e lançado pela editora da Unesp com o apoio do Ministério francês das Relações Exteriores, no âmbito do Ano da França no Brasil – apresenta uma belíssima capa - a qual encima este post -, criada por Andrea Yanaguita, em tom marrom com grandes letras em amarelo e, dominando sua porção à esquerda, a figura, em negro com traços lilás, de uma deusa grega. Para ler, apreciar e utilizar como objeto de decoração (rs..).

2 comentários:

Moacy Cirne disse...

Taí,
fiquei curioso, meu caro.
Acredito em sua dica.

Um abraço.

Unknown disse...

Cirne,

Vale a pena, sim.

Parabéns pela bela lista de "filmes inaugurais" - gostei sobretudo de ter lembrado do filme de Strab & Huillet sobre Anna Bach.

Um abraço,
Maurício.